Suspensão do Playce tem impacto de €12 milhões
Fim da publicidade antes das gravações em televisão, decidido unilateralmente pelas operadoras de telecomunicações, acontece num momento em que a procura por parte das agências de meios e dos anunciantes cresce entre 30% a 40%. APAN reúne com AdC para reverter a situação

Luis Batista Gonçalves
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O fim do Playce (na foto), suspenso desde 1 de maio por decisão dos operadores, na sequência de um parecer não vinculativo da Autoridade da Concorrência (AdC) que remonta a 15 de dezembro de 2021, obriga os anunciantes, através das agências de meios, a redistribuírem por outros suportes publicitários uma verba que poderia chegar aos €12 milhões.
“A suspensão deste serviço impacta o mercado como um todo, porque o Playce é um serviço de valor acrescentado para marcas e anunciantes, numa área em que os grupos de media nacionais se encontram numa situação delicada de oferta face à concorrência das grandes plataformas globais”, explica ao M&P Alberto Rui Pereira, CEO da IPG Mediabrands, salientando que o serviço, que permite a exibição de 30 segundos de publicidade antes das gravações em televisão, “estava a ganhar oferta, escala e relevância e que, este ano, poderia representar de €10 milhões a €12 milhões”.

Alberto Rui Pereira, CEO da IPG Mediabrands. Foto: Frame It
Filipe Neves, diretor executivo da Arena Media, também aponta para um impacto na mesma ordem de valores. “Até à suspensão, o Playce, ferramenta que nos permite estar presente de forma diferenciada, segmentada e eficaz nos ecrãs de televisão de mais de 95% dos lares portugueses, ocupava uma posição importante na estratégia de vídeo das nossas marcas. Esta solução, permite-nos adicionar camadas de qualidade ao nosso planeamento, que não conseguimos alcançar através da presença em blocos publicitários tradicionais nem com a utilização de vídeo online”, lamenta.
Embora o serviço tenha sido “discutido detalhadamente” com a AdC em 2019 e 2020 (ver caixa), o regulador considera, desde 2021, no seguimento do inquérito instaurado em 2020, que a exibição de anúncios no período que antecede as gravações de programas nas boxes configura uma prática anticoncorrencial.
“A AdC abriu um processo contra as operadoras, o que é confirmado pela existência de uma nota de ilicitude. Mas desconhecemos qualquer fator que possa ter desencadeado esta decisão. O que podemos garantir é que, ao contrário do que dizem as notícias, a suspensão do Playce não foi imposta pela AdC. Decorre de uma decisão das operadoras de telecomunicações”, assegura ao M&P fonte oficial do regulador, esclarecendo que a AdC não considera o Playce ilegal, “considera é que a utilização da plataforma coordenada entre os operadores pode violar a Lei da Concorrência, o que é substancialmente diferente”.

Filipe Neves, diretor executivo da Arena Media, também lamenta o fim do serviço
Contactados pelo M&P, a Nos e a Meo não comentam a suspensão, ao passo que a Vodafone Portugal confirma que decidiu suspender a participação no Playce “em virtude do atual contexto regulatório que envolve esta plataforma”, refere fonte oficial da operadora. A Associação Portuguesa de Anunciantes (APAN) reuniu com a AdC a 14 de maio, para discutir a suspensão do serviço, mas não revela a proposta apresentada ao regulador para desbloquear a situação.
Televisões perdem fonte de receita
A proibição da publicidade antes das gravações dos programas afeta os canais de televisão numa percentagem inferior a 5%, um valor demasiado baixo para obrigar os operadores a reverem as políticas comerciais.
“A estratégia não muda, apesar de os ‘players’ nacionais perderem uma fonte de receita, com o dinheiro a ser redirecionado para plataformas de ‘connected TV’ globais, como o YouTube”, lamenta Mário Matos, diretor comercial da Media Capital (TVI, CNN Portugal, V+, TVI Reality e TVI Player), realçando que, apesar do baixo impacto face ao volume de faturação atual, qualquer perda de receita tem impacto.
“Tendo em conta as dificuldades financeiras que as televisões vivem, essa fonte de receitas podia ser o suficiente para alguns terem uma margem positiva. No nosso caso, não tem esse impacto”, garante o responsável, à margem do evento ‘Connecting Talks: A Nova Televisão’, promovido pelo Publicis Groupe, onde o fim do Playce é abordado.
João Paulo Luz, diretor comercial de televisão e digital da Impresa (SIC, SIC Notícias, SIC Mulher, SIC Radical, SIC Caras e Opto), outro dos oradores do evento, também não altera a estratégia, apesar de lamentar o fim do serviço.
“A suspensão é um erro. Tem um impacto negativo porque era um meio que estava com taxas de crescimento entre 30% a 40%, com uma grande adesão por parte dos anunciantes e até por parte dos espectadores. Tinha números muito expressivos, porque o ‘timeshift’ entrou nos hábitos dos portugueses”, revela, estranhando a suspensão do serviço.
“É um bocadinho insólito que, com tantos abusos de posições dominantes na indústria dos media, a AdC resolva olhar para um pequeno segmento de mercado quando os grandes ‘players’ que são visados globalmente nunca foram objeto de nada”, critica João Paulo Luz.
A The Walt Disney Company (canais Star, National Geographic e Disney, 24Kitchen e Disney+) também lamenta o fim do Playce, embora desvalorize a suspensão. “A nossa estratégia comercial não muda, porque assenta sobretudo nos nossos conteúdos. Acreditamos que o investimento que era feito no serviço transitará para a oferta que existe nas plataformas de streaming”, afirma ao M&P Jorge Padinha, diretor comercial da empresa, à margem do evento do Publicis Groupe, realçando que “o Playce mostra que o mercado está preparado para abraçar novas tecnologias e para estar presente onde o consumidor está”.
APAN não toma posição pública
A decisão unilateral dos operadores suspenderem o Playce foi discutida na reunião que a APAN teve com a AdC no dia 15. “Além de terem sido pedidos esclarecimentos, foi defendida a retoma do serviço, mas, nesta fase, não nos vamos pronunciar sobre o assunto. Só o faremos lá mais para a frente”, avança ao M&P fonte da APAN.
A expetativa dos anunciantes e das agências de meios é que o serviço possa ser retomado ainda este ano. “No nosso grupo, estamos a encarar esta situação como uma suspensão temporária, esperando que se criem condições para que seja o mais curta possível”, assume Alberto Rui Pereira, CEO da IPG Mediabrands.
Em março, Meo, Nos, Vodafone começaram a informar os anunciantes e as agências de meios que iam suspender o Playce a 30 de abril. “De acordo com a informação prestada [pela plataforma] os motivos subjacentes a esta decisão devem-se à abertura de um processo de contraordenação por parte da AdC, a qual considera ilegal o Playce”, refere uma das cartas enviadas às marcas.
Licitude do Playce questionada desde 2020As dúvidas em torno da licitude do Playce remontam a 2020, ano em que a Autoridade da Concorrência (AdC) abre um inquérito. O resultado é conhecido a 15 de dezembro de 2021, dia em que a AdC acusou os operadores Meo, Nos e Vodafone e a consultora Accenture, que traz o serviço para Portugal, de restringirem a concorrência ao acordarem a inserção de 30 segundos de publicidade como condição de acesso dos clientes às gravações automáticas dos diferentes canais de televisão. “A investigação teve origem em informação divulgada em agosto de 2020 pela comunicação social, que mencionava também que esta iniciativa entre os três maiores operadores de televisão por subscrição contava com o suporte tecnológico e operacional da consultora”, refere o comunicado da AdC, salientando que “a adoção de uma nota de Ilicitude não determina o resultado da investigação”. |