Ascensão e queda de uma empresa
Puma, Real Madrid, Expo Saragoça e China XXI estão na lista de empresas que vieram a público denunciar a falta de pagamentos por parte da TBZ. O que se passou […]

Filipe Pacheco
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Puma, Real Madrid, Expo Saragoça e China XXI estão na lista de empresas que vieram a público denunciar a falta de pagamentos por parte da TBZ. O que se passou na empresa de licenciamento que se afirmava como o principal operador da Península Ibérica?
Carlos Gaspar começou por ser a primeira dor de cabeça da TBZ tornada pública. Em Abril, o jornal 24horas dedicava uma página a uma dívida da TBZ no valor de 12,5 mil euros, devido ao fornecimento de material desportivo. Mais do que o valor em questão, a empresa de licenciamento merecia destaque pelas suas ligações ao mundo do futebol. Não fosse a notícia do 24horas a dar conta de uma investigação do Ministério Público baseada em “suspeitas de fraudes, passagem de cheques sem cobertura, contrafacção e uso ilegal de marca”, tudo faria crer que a TBZ se encontraria em boa saúde financeira. Carlos Gaspar era directo nas críticas: “A TBZ está a destruir os pequenos empresários que trabalham com a produção de roupas desportivas. Apenas honra os compromissos com os clubes que representa e com a Adidas. Como não tem produção própria, encomenda o material a pequenas empresas e depois não lhes paga”. A falta de provisão de alguns cheques emitidos pela empresa foi confirmada àquele jornal pelo próprio Banco de Portugal. À data, o M&P contactou João Barroqueiro para obter mais esclarecimentos. O presidente da TBZ mostrou-se surpreendido por este jornal “dar crédito” a essas informações, referindo ainda ser sua intenção processar Carlos Gaspar por este estar a faltar à verdade.
Meses depois, o valor das dívidas tornadas públicas e que estão por saldar passou das dezenas de milhar para os milhões de euros. Ao mesmo tempo, a TBZ anunciou um processo judicial de recuperação da empresa.
O caso mais recente é o dos 784,6 mil euros em falta à Segurança Social, segundo avançou o Jornal de Negócios. Já na semana passada, o M&P dava conta de um processo interposto em tribunal pela Expoagua, entidade pública que organizou a Exposição Internacional de Saragoça, por a TBZ estar a dever 200 mil euros referentes à exploração das lojas oficiais da Expo e dos direitos de imagem do evento que terminou a 14 de Setembro. Também dezenas de fabricantes detentores dos direitos de comercialização dos produtos da Expo uniram esforços no mesmo sentido. Motivo? Dizem estar há meses “a tentar que a TBZ pague as mercadorias que lhes comprou e não pagou”.
Apesar de não comentar as dívidas e as intenções das entidades espanholas, João Barroqueiro explicou ao M&P que nos pressupostos do contrato estavam os cerca de 6,5 milhões de visitantes únicos previstos pela organização. O presidente da TBZ disse ainda que foram estes números que permitiram à sua empresa fixar as metas financeiras e todo o planeamento do evento. Os números, segundo a versão da semana passada, ficaram aquém das expectativas. A TBZ observou em Agosto que “as visitas eram, em grande parte, repetições, logo pessoas que não iriam adquirir produtos”. Mesmo assim, o presidente da empresa sublinhava na semana passada a vontade de “chegar a acordo e negociar com todos os credores envolvidos no processo”.
Esta é a visão mais recente sobre o negócio que envolve a exposição internacional. A 3 de Setembro, dias antes do encerramento do evento, a perspectiva era mais optimista. A TBZ fazia chegar às redacções, através da sua agência de comunicação YoungNetwork, uma nota de imprensa onde apelidava o contrato com a Expo Saragoça como o “maior negócio de merchandising da Península Ibérica”. Segundo as previsões da empresa, a gestão do merchandising oficial da Expo e a concessão das sete lojas do recinto da feira poderiam vir a representar um volume de negócios de seis milhões de euros.
Do Bueréré à Biplano
As ligações de João Barroqueiro ao mundo do licenciamento remontam a 1996, quando fundou a Edit, empresa de merchandising que teve o Bueréré como rampa de lançamento. A sua relação com a estrutura do programa infanto-juvenil permitiu-lhe ambicionar outros voos na sua carreira. É que, como confirma fonte próxima de Ediberto Lima, então produtor do programa da SIC, João Barroqueiro era um dos protagonistas do programa infantil, dando vida ao Mágico Damião. Em 2004, Barroqueiro explicava em entrevista ao M&P os primeiros e árduos passos da empresa. Quando pretendeu os direitos dos Teletubbies da BBC, viu a Biplano ficar com o licenciamento, apesar da proposta colocada em cima da mesa pelos espanhóis ter sido inferior à sua. “Portugal não tinha grande credibilidade”, sublinhava. Acaba por ser com a mesma Biplano que a TBZ consegue entrar nos licenciamentos internacionais, ajudada pelo facto da empresa espanhola passar a deter 25 por cento da TBZ. O acordo foi suspenso em 2005 e agora, contactado pelo M&P, Jordi Rey, director-geral da Biplano, explica que a ruptura se deveu a “graves problemas financeiros resultantes de dívidas consideráveis da TBZ à empresa”. Rey afirma estar ainda a decorrer em tribunal uma acção relativa a uma dívida pendente da TBZ. Mas o corte de relações, refere o director-geral da Biplano, também foi originado pelas práticas menos transparentes da empresa portuguesa: “As vendas eram feitas sem seguir as normas pautadas pelos proprietários das marcas”.
A TBZ já geria, em 2004, o licenciamento das marcas Benfica, Sporting, Braga e Académica. “Muitos milhões de euros” terá sido a verba despendida pela TBZ para garantir a exploração das marcas dos dois maiores clubes lisboetas durante dez anos, dizia à data João Barroqueiro ao M&P. A empresa esperava terminar 2004 com uma facturação de 12,5 milhões de euros.
Dois anos depois era a Porto Comercial, empresa gestora das áreas de licenciamento e sponsorização do FC do Porto, a fechar um acordo com a TBZ. Este negócio garantiu um encaixe de pelo menos de 13,5 milhões de euros ao clube nortenho. Fora do futebol, outras marcas iam engrossando o portfólio da estrutura. O canal Panda, o canal Extreme e a Playboy são algumas das empresas a confiar as suas licenças à empresa. Em 2006 a estrutura empresarial tinha já escritórios em Madrid, Barcelona e Londres e esperava terminar o ano com uma facturação de 20 milhões de euros.
De Madrid a Porto Alegre
Foi pelo futebol que começaram os problemas mais visíveis da TBZ. E logo com o Real Madrid, clube com o qual a TBZ fechara, em Outubro de 2007, um acordo para gerir o licenciamento do merchandising do clube para a Europa, envolvendo verbas superiores a 50 milhões de euros anuais. Era um momento histórico para a TBZ, mas foi sol de pouca dura. Em Setembro deste ano, pouco tempo antes da renovação do contrato, o clube espanhol rescindiu-o unilateralmente. Como argumento, os espanhóis evocaram o incumprimento dos objectivos na angariação de patrocínios. A TBZ agiu de imediato e interpôs uma providência cautelar para impedir que o clube espanhol executasse, a seu favor, uma garantia bancária de dois milhões de euros.
Do outro lado do Atlântico, quando tudo parecia bem encaminhado para que a TBZ passasse a concessionar o futuro estádio do Grémio de Porto Alegre por um período de 20 anos, os responsáveis do clube brasileiro tomam conhecimento, através do 24horas, das dívidas da empresa portuguesa e são prontos a agir. A exposição das contas da TBZ ao conselho deliberativo do clube foi uma das exigências anteriores à assinatura do contrato. Freitas Lima, presidente do conselho deliberativo, conforme avançou a imprensa brasileira em Maio, queria certificar-se da saúde financeira da empresa e, caso os números apresentados pela TBZ confirmassem as dificuldades de que o 24horas dera conta, o clube iria recusar-se a formalizar o acordo. O contrato não chegou a ser assinado e o clube brasileiro encontra-se de novo à procura de um parceiro para gerir a concessão do estádio.
Os clubes portugueses
Em Novembro, o pedido judicial de recuperação da TBZ surgiu como o reconhecimento público das fragilidades da empresa. O abandono das quatro lojas do FCP, da loja da Académica, da loja do Sporting Clube de Portugal e o encerramento dos escritórios em Madrid e em Barcelona foram algumas das medidas encontradas para “aumentar a robustez financeira da empresa”. Com o abandono da exploração do Bingo do clube de Alvalade – 15 meses fechado por falta de licença da Câmara – que, segundo a empresa, contribuiu para um prejuízo de 1,2 milhões de euros, e a redução do quadro de pessoal, a TBZ propôs-se a poupar 1,6 milhões de euros por ano.
Mas o anunciado plano não veio colocar um ponto final nos problemas da TBZ. No período de duas semanas são divulgados mais dois processos. O mais radical foi interposto pela Puma, a marca dos equipamentos oficiais do Sporting, que pediu a falência da empresa. Motivo: uma dívida de um milhão de euros. O valor foi especificado ao M&P por fonte oficial da Puma, que acrescentou nunca ter existido da parte da TBZ a iniciativa de apresentar um plano de pagamento à empresa.
Também a China XXI, importadora de artigos provenientes da China e um dos fornecedores da TBZ, apareceu a reclamar dívidas. Ao proprietário eram apresentados cheques pré-datados e letras bancárias como garantia de pagamento. Mas a não liquidação de uma dívida que ascende a um milhão de euros levou a que a China XXI lançasse uma providência cautelar de arresto sobre os bens móveis que a TBZ possuía num armazém em Vialonga.
Quando o 24horas deu conta da primeira dívida tornada pública por um fornecedor, Ricardo Maia, porta-voz do Sport Lisboa e Benfica disse àquele diário desconhecer a situação, acrescentando que o Benfica não tinha intenção de “trabalhar com empresas que não tenham idoneidade”. Agora, contactado pelo M&P, o mesmo responsável referiu que o Benfica – clube a quem a TBZ gere os direitos de merchandising – se nega a prestar quaisquer declarações sobre a empresa. O mesmo aconteceu com a Porto Comercial, cujos responsáveis não responderam às questões colocadas pelo M&P. Mais perto do fim parece estar a relação com a Académica. Esta quarta-feira era notícia a eminência de rescisão do contrato, por parte do clube de Coimbra, terminando uma relação que remontava a 2003.
O que (ainda) está no site
Fora do universo do futebol, os canais Panda e Extreme, Playboy, The Cat, Miss Spider, Bricot e Franklin são ainda apresentados no site da TBZ como algumas das licenças representadas pela empresa. Contactado pelo M&P, João Barroqueiro não quis esclarecer quais a marcas que ainda representa, nem tão pouco o estado actual da TBZ. Certo é que a informação que consta no site da empresa está desactualizada. O canal Panda entregou recentemente a gestão do merchandising à galega Semper Gallaecia. Marta Sanz , general counsel da Chello Multicanal, referiu ao M&P que o que motivou a mudança foi “o atraso na disponibilização e a falta de atenção verificada nos últimos meses de relação comercial”. O canal Panda também está a tentar regularizar a situação financeira com a TBZ, antes de “adoptar medidas legais”. O escritório de Londres, que ainda consta no site da empresa, já não se encontra em funcionamento há um ano.