Carla Borges Ferreira, directora do Meios&Publicidade
Venham mais 20
“Nestes 20 anos mudou tudo, não é? Se calhar nem é assim tanto. Ou se calhar é, mas porque nós mudámos. Agora, conhecem alguém que questione a importância do jornalismo? Do jornalismo livre e independente? Conhecem alguma marca que consiga viver sem comunicação? Não falo só do spot de 30 segundos ou da página impar, falo de comunicação? Conhecem alguma geração que não consuma conteúdos? Enquanto a resposta for negativa, pode ter mudado tudo, mas o essencial, o que é realmente importante e o que dá sentido a esta indústria permanece tão fundamental como sempre.”
Carla Borges Ferreira
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Março de 1998. Chegava a um número selecionado de profissionais a primeira edição do Meios & Publicidade. Na altura dava os primeiros passos no jornalismo, depois de um estágio na TSF. “Estás a ver este dossier?”, perguntou Manuel Vilas Boas durante a entrevista, “dá-me um bom motivo para seres escolhida”. Era um daqueles dossiers de lombada grande, a abarrotar de currículos. Lá disse qualquer coisa que não deve ter corrido muito mal. Faltava ser aprovada pelo Francisco Sena Santos, editor das Manhãs 1… tinha sido meu professor, tarefa facilitada. “Vais fazer o estágio, mas não há a mínima hipótese de ficares. Não estamos nem vamos contratar, a luta é para não despedirmos”, avisou logo, para depois explicar que a rádio dava não sei quantos mil contos – sim, contos – de prejuízo por mês. A redacção da TSF era o tudo o que tinha imaginado, mas mil vezes melhor. Equipa de luxo, um companheirismo que nem sabia possível… e a paixão pelo jornalismo. Era mesmo paixão. Estava situada na Avenida de Ceuta, no mesmo edifício da Grande Reportagem – dirigida por Miguel Sousa Tavares – e da XFM, de Luis Montez. À sexta-feira, já sabíamos que a manhã ia ser mais fácil e que não seria necessário pensar muito no tema do Fórum: era dia d’Independente, estava garantida a animação. O Pedro Durães e o Rui Oliveira Marques também teriam certamente histórias para juntar a esta… E porque é que falo desta história? Porque todos os dias falamos da crise, mas agora, ao tentar recuar duas décadas, os tempos já não eram fáceis. A rádio mais influente do país dava prejuízo, a XFM, a rádio da Imensa Minoria, acabou e a Grande Reportagem foi transformada em suplemento uns anos mais tarde e já não existe e O Independente não resistiu. O Público, o jornal referência, já era deficitário. As televisões privadas davam os primeiros passos. A SIC era um caso de sucesso, a TVI parecia condenada a ser o Canal 4. E terá sido neste contexto que o Pedro Corrêa Mendes, apoiado pelos irmãos Francisco e Pedro Fino lançou o Meios&Publicidade. Um “jornal independente para profissionais da comunicação”? Não sei se lhes chamaram loucos…
Nestes 20 anos mudou tudo, não é? Se calhar nem é assim tanto. Ou se calhar é, mas porque nós mudámos. Os nossos hábitos mudaram, a forma como consumimos media mudou, o modo como somos – ou é mais difícil sermos – impactados pela publicidade mudou. O negócio mudou. É tudo mais complexo, já nada é linear, as fórmulas de sempre já não funcionam, o offline – em todos os sectores – começa a ser uma memória distante. Agora, conhecem alguém que questione a importância do jornalismo? Do jornalismo livre e independente? Conhecem alguma marca que consiga viver sem comunicação? Não falo só do spot de 30 segundos ou da página impar, falo de comunicação? Conhecem alguma geração que não consuma conteúdos? Enquanto a resposta for negativa, pode ter mudado tudo, mas o essencial, o que é realmente importante e o que dá sentido a esta indústria permanece tão fundamental como sempre. Se calhar até mais, na medida em que as ameaças são maiores e mais complexas e nada é um dado garantido. Nestes 20 anos mudou tudo? Nestes 20 anos mudou o negócio. E o drama é que não há respostas, não há certezas, não há formulas mágicas. Nem em Portugal nem em parte nenhuma – sim, aqui temos o problema da escala a complicar. Mas é por isso que este novo mundo é tão fascinante e desafiante.
Nas páginas que se seguem vai encontrar uma retrospectiva do que foram os últimos 20 anos na área dos media, marketing e publicidade. Vai também encontrar o testemunho de profissionais que, através das suas experiências e opiniões, nos ajudam a recuar no tempo e a perspectivar o futuro. Daqui a 10 anos, o Meios&Publicidade voltará a repetir o exercício. Não sei se os conteúdos ainda lhe vão chegar em papel, se só online, se em texto ou em vídeo… Mas também não me parece que seja relevante. O importante, e é válido para o M&P e para todas as outras marcas de informação, é continuarmos a merecer a atenção/tempo dos leitores e a confiança das marcas. No caso do M&P – que já é muito mais do que um jornal –, o desafio é sermos, cada vez mais, o fórum de reflexão e o ponto de encontro de toda a indústria. É com este propósito que continuaremos a trabalhar sendo, como no primeiro dia, o “jornal independente para profissionais da comunicação”.
Ps – Não sei se em 1998 chamaram loucos ao Pedro Corrêa Mendes e ao Francisco e Pedro Fino por apostarem nesta aventura. Se chamaram, o tempo já se encarregou de provar que o núcleo fundador do M&P estava certo. O Pedro Corrêa Mendes deixou a estrutura accionista do jornal no final de 2017 mas este, creio, será sempre o “seu” jornal. A estrutura accionista é agora detida, em partes iguais, por Francisco e Pedro Fino, que reforçaram a aposta e confiança na marca. Na administração está também Henrique Chaves Fino, que vos convido a conhecer, no texto da página 54.