Estilo Obama à margem de Portugal
Os preparativos para a campanha eleitoral que hoje termina faziam antever um novo tipo de fórmula para a disputa das legislativas. A eleição de Barack Obama, que obedeceu a técnicas […]

Rui Oliveira Marques
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Os preparativos para a campanha eleitoral que hoje termina faziam antever um novo tipo de fórmula para a disputa das legislativas. A eleição de Barack Obama, que obedeceu a técnicas que mereceram a atenção dos profissionais de comunicação de todo o mundo, parecia pressagiar uma mudança na forma de fazer campanha eleitoral em Portugal. David Plouffe, estratega da campanha do agora presidente dos EUA, chegou a vir a Lisboa em Março, onde explicou como a candidatura privilegiou a internet para angariar voluntários, eleitores e fundos. Foi uma conferência que recebeu elevada cobertura mediática. Ben Self e Dan Thain, responsáveis pela Blue State Digital, empresa que criou a plataforma interactiva online da campanha de Obama, também estiveram em Lisboa para participar num encontro da candidatura de Sócrates. Ao mesmo tempo, era notícia a colaboração, para a área digital, entre aquela empresa norte-americana e o PS. A poucas horas de terminar a campanha, sentiu-se o efeito da estratégia Obama – a aposta na web 2.0 – na comunicação com os eleitores? “Tal como o David Plouffe disse, não se pode clonar uma campanha dos EUA para a Europa, nomeadamente no que diz respeito ao digital”, refere António Cunha Vaz, líder da agência de comunicação que trouxe o consultor de Obama a Portugal. “Há países onde o investimento em publicidade na internet é enorme. Aqui isso ainda não acontece. A campanha, do ponto de vista digital, faz-se nos blogues, entre as maledicências de cada lado e menos na apresentação de ideias”, completa Cunha Vaz.
A contribuição da equipa da área digital de Obama para a campanha do PS foi notícia de primeira página, relembra Rui Calafate, que está à frente da agência de comunicação do BO Group. “Havia muita expectativa, mas praticamente não se notou. Enquanto observador não os vejo, não há nenhuma grande diferença ou mais-valia.” A presença dos socialistas nas redes sociais tão pouco conseguiu alavancar outro elemento crucial na estratégia de Obama: ser decisivo para a angariação de fundos.
A avaliar pelos resultados, a Blue State Digital não terá levado em conta os “quatro milhões de pessoas em Portugal com acesso à internet. E que aqui também há blogues, fóruns e redes sociais. E telemóveis. Muitos telemóveis”, sustenta Jorge Teixeira, director criativo da agência digital Excentric. É por isso que o criativo destaca que, em termos de web 2.0, “a melhor coisinha que apareceu, e já foi no balanço das eleições europeias, talvez tenha sido a recolha via telefone das opiniões dos eleitores que o PSD fez no início deste ciclo de Política de Verdade”.
Olhando para os projectos digitais dos principais partidos, Pedro Janela, que dirige o WYgroup, não hesita em dizer que todos “tentaram ir na onda do que Obama tinha feito, mas em política o conteúdo é importante e não parece que a nível nacional haja alguém comparável a Obama”. Mesmo assim, o responsável, entre outros, pela agência digital By, acredita que houve uma evolução “muito grande, principalmente na forma como se utiliza redes sociais e os vídeos. Destaco o Facebook e o Twitter que nas últimas eleições, há quatro anos e meio, não existiam de todo”.
Na área digital, entre os profissionais contactados pelo M&P, o PS foi o partido que recebeu mais atenção, devido ao envolvimento da Blue State Digital. Mas, mais uma vez, as comparações com a estratégia de Obama são inevitáveis:
“O site Sócrates2009 foi tirado a papel químico do que fez Obama. Até a ideia do MyMov (movimento de voluntários) ou a utilização do azul e encarnado são semelhantes”, declara Pedro Janela, que completa:
“Levaram demasiado longe a cópia. Podiam ao menos ter optado pelo encarnado e verde ou pelo encarnado e rosa” como cores dominantes do portal.
Bruno Ribeiro, autor dos blogues PubAddict e Dissonância Cognitiva, considera que “o PS teve a melhor presença, apesar de muito similar ao delineado para o agora presidente dos EUA. “Foi tudo feito a reboque do Obama.
Mesmo assim, fiquei surpreendido pelo profissionalismo da campanha do PS ao ter contratado uma empresa especializada na área”. Apesar de um protagonismo menor que aquele que se estaria à espera na área digital, assistiu-se a uma “evolução inacreditável em relação ao que foi feito há quatro anos”, refere Pedro Janela que aponta, no entanto, para as candidaturas autárquicas, onde se encontram “situações ridículas”. E justifica:
“Tentam copiar o que é feito a nível nacional, mas é decepcionante porque não têm acompanhamento diário ou políticas de rede. É demonstrativo que as ferramentas evoluíram muito, mas a qualidade da própria mensagem na web é ainda fraca e amadora.”
Entre debates e o Gato Fedorento
A televisão continuou a ser, por isso, o principal meio, já que foi aí que decorreram os frente-a-frente entre os cinco líderes e onde se assistiu a mais uma etapa do fenómeno Gato Fedorento. Rui Calafate destaca, como um dos episódios da campanha, o “muito tempo perdido para acordar debates que acabaram por se realizar”. A avaliar pelas audiências, os confrontos eram aguardados pelos portugueses. O debate Sócrates/Portas ficou com 15,2% de audiência na TVI e, além de ter sido o duelo mais visto da série de debates, foi o terceiro programa com maior audiência na primeira semana de Setembro, só ultrapassado pelos jogos de futebol Benfica-Setúbal e Dinamarca-Portugal. O Sócrates/Louçã chegou aos 15% na RTP, enquanto o frente-a-frente Sócrates/Ferreira Leite alcançou os 14,1% na SIC. Terminado o ciclo de debates, ninguém podia adivinhar o fenómeno de audiências que se seguiria. Inspirado no formato norte-americano Daily Show, foi o Esmiúça os Sufrágios do Gato Fedorento, por onde passaram os candidatos, o programa mais visto da semana passada, conseguindo com a presença de Paulo Portas, chegar aos 20,4% de audiência.
Um em cada cinco portugueses assistiu ao programa, um resultado inédito nos dias de correm. “Os debates no Gato Fedorento foram uma vitória”, considera Rui Calafate.
“Houve uma resposta da população que não tem participação política, nomeadamente os mais jovens”. A ida dos candidatos ao programa foi “um exercício de simpatia útil para todos, incluindo para os próprios Gato que conseguiram audiências maiores que as do seu último programa.” O programa terá conseguido “dar uma face dos políticos e da política que os humaniza, pondo-os cá em baixo ao pé de nós”, considera Jorge Teixeira. ” Quando se põe um microfone à frente de um político, de um estilista de moda ou de um chef de cozinha, todos ficam seríssimos. Respondem a perguntas sobre qual a sua cor preferida como se disso dependesse a cura para o cancro.
Na política é igual”, considera o responsável. Resta esperar por domingo para saber se o interesse televisivo tem impacto, pelo menos, na taxa de abstenção.
– Quando as campanhas são um meio
“Todos os candidatos procuram tirar o máximo proveito de todos os Media, mas algumas diferenças subtis permitem fazer uma metáfora com os vários meios de comunicação. A Campanha de José Sócrates é uma típica Campanha de Televisão. A Televisão é um meio completo (dizia-se). Dá visibilidade, pode emocionar, pode dar argumentos racionais, produz imagem de marca. É isso que o PS pretende à volta do seu líder: construir, revitalizar a sua imagem de homem seguro, determinado, moderno, etc. Já Manuela Ferreira Leite tem uma campanha de Rádio: a Rádio “repete” dizem os manuais. E a campanha do PSD procurou um chavão (Política de Verdade) que vai repetindo, mesmo sem explicar. É uma campanha com a chamada “Voz de Companhia”: voz séria, que diz as coisas sérias. Paulo Portas tem a campanha mais Internet de todas. Começa com um conceito muito web 2.0: dá voz ao que as pessoas “pensam” e “dizem” e alavanca daí os seus argumentos. É também uma campanha manifestamente interactiva – ninguém vai a mais feiras, dá mais beijos e abraços. “É uma campanha voto-a-voto” disse o próprio Portas – e isso é uma comunicação absolutamente web. A CDU tem historicamente uma campanha “word-to-mouth”, campanha de envagelização boca-a-boca, que começa nos seus redutos mais fiéis (Alentejo, Sindicatos, Fábricas) e depois se estende ao suburbano e por fim ao eleitorado em geral. O Bloco de Esquerda tem uma campanha tipo Marketing Directo: sabe que é o seu eleitorado potencial; sabe a oportunidade política que tem pela frente (desilusão do eleitorado PS) e faz mensagens tipo direct-mail: directamente para aquelas pessoas e tentanto cobrir todos os argumentos.”
Jorge Teixeira, Excentric
– Quem fez a melhor campanha
Se avaliações de campanhas resultassem em vitórias eleitorais, o CDS deveria sagrar-se vencedor no próximo domingo à noite. Os profissionais de comunicação são unânimes em destacar o desempenho do partido de Paulo Portas. “A melhor campanha de todas foi a de Paulo Portas, depois diria que foi a de Sócrates e depois vêm todas as outras. O CDS vai ser a grande surpresa das eleições”, sustenta Rui Calafate. Cunha Vaz também destaca o percurso da campanha do CDS. “Se alguém tem de ser premiado pelo esforço que fez é o PP. O CDS apresenta-se muito pró-activo e moderno, apesar da sua mensagem basear-se em temas como a segurança e a família”, refere Cunha Vaz. O publicitário Jorge Teixeira sublinha que Paulo Portas consegue, face aos outros líderes, pontos na cobertura televisiva: “Ganha tempo de antena, marcando a agenda e tendo um discurso próprio. Se será eficaz nas urnas… é outra coisa”. Além disso, “não se sente que a campanha do CDS-PP tenha muito menos meios que a do PS e a do PSD”, completa o director criativo da Excentric.
Cunha Vaz sublinha também o desempenho de Sócrates: “Não que a campanha tenha sido diferenciadora, mas é o alvo de todos os partidos e, mesmo assim, consegue fazer uma campanha que não entrou pela negativa, mas pela apresentação de ideias, o que é difícil para quem está no governo. Foi a campanha mais jovem, mais animada, mais pela positiva e menos lamechas.” Mesmo assim, Cunha Vaz refere que o frase Avançar Portugal, transversal à campanha do PS, “não é empática”. Já Manuela Ferreira Leite revelou-se “uma surpresa agradável na forma como fisicamente aguentou a campanha”, mostrando que tem uns “jovens quase 70 anos”.
O consultor de comunicação Rodrigo Saraiva, a par de João Gomes de Almeida e Nuno Gouveia, tem recolhido e comentado no blogue Imagens de Campanha, os cartazes das eleições legislativas e das autárquicas que se avizinham.
Ao M&P, Rodrigo Saraiva também diferencia a linha seguida pelo CDS-PP nas legislativas, um partido “que já habitou a bons cartazes. Embora desta vez o grafismo não marque a diferença, consequência de mensagens, culminando com o ‘Há cada vez mais pessoas a pensar como nós’, é das melhores”. Já o PS, em termos de fotografia e de grafismo apresentou “dois excelentes cartazes: o primeiro e último apenas com slogan Avançar Portugal”. O consultor justifica esta distinção: “As fotografias de José Sócrates estão muito bem conseguidas, destacando a última que não foi tirada a pensar num cartaz e transmite uma imagem de positivismo.” Já sobre o maior partido da oposição, o consultor e blogger defende que “apresentou um plano bem pensado de mensagens, culminando num cartaz simples e eficaz com um slogan que finaliza bem a estratégia – Chegou a Hora da Verdade”. No entanto, os cartazes do PSD com fundo laranja e cinzento não tinham “uma imagem e cor apelativas, o que não ajudava a prender a atenção das pessoas”. Menos positivo foi o desempenho, ao nível de cartazes, do Bloco e da CDU. “O Bloco de Esquerda, que nos habitou a bons cartazes, surpreendeu pela negativa pela fraca imagem destes, em especial o último, com várias fotografias dos candidatos mal conjugadas”: Mesmo assim, “na mensagem continuam a ser muito fortes. O cartaz do Estamos Prontos é claro exemplo disso”. A CDU “mantém o seu registo habitual”, descreve Rodrigo Saraiva.
Há ainda uma ressalva, ao nível dos consultores de comunicação. “Nestas eleições, quem recorreu a profissionais, preferiu portugueses”, descreve Rui Calafate. “No passado, houve candidatos que recorreram ao mercado brasileiro. É significativo que quem recorre a agências prefira as portuguesas, tanto para as legislativas como para as autárquicas”, remata.