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Por que é que às mulheres não fica bem?

A Wells apostou em riscar todos os “Não” da expressão “não fica bem”, ouvida ao longo da vida, para ajudar a reduzir a pressão no dia a dia feminino

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Por que é que às mulheres não fica bem?

A Wells apostou em riscar todos os “Não” da expressão “não fica bem”, ouvida ao longo da vida, para ajudar a reduzir a pressão no dia a dia feminino

Sobre o autor
Paula Cosme Pinto

Celulite, manchas, estrias, borbulhas, grisalhos, rugas. Engordar, sexualizar, suar, ambicionar, gritar, chorar, mandar, desejar, amamentar, não amamentar. Meter-se em sarilhos, ter filhos, não os ter, comer, envelhecer, escolher. Divertir-se, maquilhar-se, queixar-se, elogiar-se, afirmar-se, pedir, rir, exigir. Existir? A lista de coisas que não ficam bem às mulheres começa logo na infância, como um guião prescritivo do que podemos ou não podemos ser, dizer e parecer, sob risco de não atingirmos um estereótipo de perfeição que, convenhamos, é uma meta que nos condena ao falhanço. Um guião escrito por uma sociedade cuja matriz é, ainda, inquestionavelmente machista, mas que já não assenta como regra sine qua non a cada vez mais mulheres.

Durante décadas, as marcas e o universo da publicidade contribuíram, e muito, para a normalização de uma forma enviesada de olharmos para o sexo feminino. Ora através da própria representação – amiúde, sexualizadas, submissas ou irrealistas na sua imagem e atitudes – , ora da condescendência e menosprezo pelas mulheres enquanto potenciais consumidoras e geradoras de lucro. A recente campanha apresentada pela Wells parece rasgar com tudo isto, e mostra como é possível mudar tal narrativa, encarando as mulheres, no seu todo, com o respeito e a dignidade que lhes, nos, tem faltado. Como? Começando pelo óbvio: dar-lhes voz. Uma voz real.

Tanto em mupis espalhados pelo país, como no spot em vídeo que corre televisões e redes sociais, a Wells apostou em riscar todos os “Não” da expressão “não fica bem”, ouvida ao longo da vida, com o objetivo de ajudar a reduzir a pressão que pauta o dia-a-dia feminino. Relembrando, desta forma, todas as mulheres que não estão sozinhas a lidar com as imposições sociais, que têm o direito a serem quem são, e como são, tanto na sua individualidade, como nos muitos pontos que nos são comuns a todas, da puberdade à maternidade, do envelhecimento à menopausa.

Com uma mulher na liderança da sua própria equipa de marketing, a marca aliou-se a outras profissionais para dar vida a esta campanha: Sara Soares, diretora criativa da agência VML, Cristiana Miranda, realizadora da Playground, e a artista Marisa Liz, que dá a sua voz a todas nós. E digo a todas nós porque será praticamente impossível uma mulher não se rever em, pelo menos, uma das frases. A emoção, tendencialmente menosprezada porque, lá está, “não fica bem”, é, aqui, a grande estratégia de comunicação.

A par da campanha publicitária, a marca apresenta ainda o Podcast “Não Fica Bem falar de…” com Jessica Athayde, que trará para a discussão temas relacionados com as diferentes fases da vida das mulheres que ainda incomodam, perturbam ou, simplesmente, precisam de novas abordagens. Lança também um site sobre a menopausa, desenvolvido em colaboração com vários especialistas reconhecidos, disponibilizando informação útil, credível e acessível; e está a desenvolver um Grande Estudo sobre a Menopausa em Portugal, com apresentação pública para breve.

Ao todo, são três milhões de euros investidos numa estratégia sobre o bem-estar feminino em todas as fases da vida. Faz sentido? Cerca de vinte anos depois de a Dove ter feito uma aposta semelhante, com a então tão disruptiva campanha “Real Beauty” – que ousava mostrar corpos reais, de mulheres de todos os formatos e idades – ainda haverá quem questione se isto não é um tiro no pé. A resposta é simples: não. E não falo apenas na premente responsabilidade social que o universo empresarial tem quanto à construção de sociedades mais igualitárias e diversas, falo mesmo de negócio.

As mulheres são metade da força laboral do nosso país, presença ativa e cada vez mais relevante na nossa sociedade, têm um poder económico exponencial, mesmo com as conhecidas diferenças salariais, e um crescente poder de escolha e de decisão. São uma fatia do consumo com enorme expressão e capacidade de aquisição, é todo um desperdício não serem consideradas desta forma. E, mais do que tudo, as mulheres estão cansadas de não se sentirem representadas. De não encontrarem narrativas que as enalteçam, em detrimento das que apenas lhes recomendam as mais variadas formas de ‘anti’ realidade. Quem as representar primeiro, quem falar, pensar, compreender e vender na sua direção, com seriedade, retirando-lhes de cima décadas de imposições sociais inadequadas, quem conquistar a sua confiança, quem tiver como missão aligeirar-lhes a vida, eternamente em sobrecarga, terá nelas consumidoras fiéis.

A Wells tem 70% de clientes do sexo feminino, é, portanto, simplesmente inteligente fazer esta aposta. E não tenho dúvidas de que irá colher os frutos, principalmente se o continuar a fazer com espírito pedagógico e de missão, tal como a Dove fez e colheu, sendo hoje marca incontornável no segmento de beleza e bem-estar. Dar ferramentas válidas e acesso a informação é meio caminho andado para vender efetivamente produtos e serviços. O bem-estar feminino, em oposição à apologia da beleza inalcançável que foi mote deste segmento durante demasiado tempo, não é apenas uma tendência, é um caminho seguro de negócio a percorrer.

Crónica de Paula Cosme Pinto, comunicadora pela igualdade de género

Sobre o autorPaula Cosme Pinto

Paula Cosme Pinto

Comunicadora pela igualdade de género
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