Não há marcas portuguesas globais. Porquê?
Não temos capacidade de investir? Temos mais medo de arriscar? Alguns dirão que sim, outros que não. Talvez seja um pouco de tudo

Marcas globais são, de forma muito resumida, as identidades que atravessam fronteiras e tornam-se verdadeiras referências nas suas categorias. São reconhecidas por todos não só pelos seus produtos, mas também pelos seus valores e posicionamento. Estamos a falar de marcas como a Apple, Microsoft, Google, Coca-Cola, Visa, Volvo, Chanel e Adidas, etc.
Segundo as estimativas mais recentes da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (WIPO) existem mais de cem milhões de marcas registadas globalmente. Entre marcas locais, nacionais, internacionais e globais nascem dezenas de milhões de marcas todos os anos.
A maior parte destes novos registos são criados em mercados muito competitivos, como a China e os Estados Unidos, com destaque para os impressionantes 40 milhões de marcas ativas chinesas.
A união europeia tem apresentado uma evolução mais tímida, com um número a rondar 7,6 milhões de marcas ativas. Ao analisar os pedidos de novas marcas nos últimos 20 anos dentro da União Europeia (UE), encontramos Portugal em 6º lugar com 313.426 pedidos nacionais, ficando muito abaixo do expectável em relação a pedidos internacionais, posicionando-se num modesto 15º lugar com 76.760 pedidos.
Se tivermos em conta que cerca de 24% dos pedidos portugueses são recusados ou invalidados na UE, e 37% não passam nos Estados Unidos, verificamos o fraco investimento na internacionalização e globalização das marcas portuguesas. A que se deve esta falta de competitividade?
Dificilmente será a falta de qualidade ou mesmo a quantidade de produtos exportados; atualmente conseguimos, por exemplo, produzir para maior parte das marcas globais mais relevantes na indústria têxtil. Será que não somos inovadores?
Não temos capacidade de investir? Temos mais medo de arriscar? Alguns dirão que sim, outros que não. Talvez seja um pouco de tudo. A realidade é que não existem marcas globais portuguesas porque não temos marcas internacionais suficientes para elevar o nosso nível.
É difícil? É, mas não existe outra forma, só competindo com os melhores é que nos tornamos melhores. Antes de uma marca se tornar global, tem de ser a melhor na sua cidade, na sua região, no seu país e depois em vários países. Não tem de ser a maior, mas a melhor.
Existem vários mitos sobre os quais fomos alicerçando as nossas convicções sobre o nosso insucesso. Começando com o mito da falta de escala. Ora, Portugal tem cerca de 10,3 milhões de habitantes, a Dinamarca tem cerca de 5,9 milhões, ou seja, metade da população portuguesa, mas em contrapartida tem cerca do dobro do pedido de registo de novas marcas em mercados internacionais: 145.631.
Além disso, consigo lembrar-me de três ou quarto marcas globais dinamarquesas: Lego, Carlsberg, Bang&Olufsen e Maersk (a maior empresa de transporte marítimo e logístico do mundo). É impressionante que, segundo o estudo BAV (Brand Asset Valuator) do WPP de 2024, tanto a Lego como a Bang&Olufsen fizeram também parte das dez marcas com maior influência global no setor do retalho.
É também curioso que, apesar de exaltamos constantemente o nosso ecossistema privilegiado de start-ups, uma das marcas de start-ups europeias mais bem-sucedidas dos últimos tempos seja a Vinted, da Lituânia, um país com apenas 2.872 milhões de habitantes.
O que fizeram estas marcas para ultrapassar a falta de escala no mercado de origem? Muito provavelmente, ao desenvolverem e investirem na sua marca, prepararam-na com um propósito universal, que gerou benefícios, que se tornaram vantagens competitivas e que no fim criaram valor. Ou seja, mais do que se focar apenas no negócio e no produto, investiram realmente na construção da marca, como um ativo valioso e não apenas tático.
Portugal precisa de criar marcas globais, não só para conquistar a devida influência nas indústrias onde já contribui com produtos de inquestionável qualidade, mas também porque o mundo precisa de marcas com propósitos e linguagens universais, que acrescentem valor à vida das pessoas e contribuam para narrativas coletivas, cada vez mais necessárias.