“O processo da TDT foi conduzido para confundir e não para esclarecer”
Investigador acusa a ANACOM de servir os interesses da PT e prevê que o apagão do sinal analógico instale o caos.

Elsa Pereira
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A Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM) divulgou esta semana um inquérito levado a cabo pela Marktest que mostra que, a poucos dias da conclusão do processo de migração para a TDT (Televisão Digital Terrestre), 7,8% da população não tem intenção de se preparar para o apagão final do sinal analógico que terá lugar no próximo dia 26 deste mês. Para Sérgio Denicoli, investigador da Universidade do Minho e especialista nesta matéria, “é impressionante como todo o trabalho de divulgação por parte da ANACOM tem funcionado”. “Tem-se tentado sempre dourar a pílula, mas desde o início que há assimetria de informação”, acusa o perito. “Não percebo como é possível que digam que ‘já 70% da população aderiu à TDT’. Já? Então e os outros 30%? O apagão vai ser um caos”, preconiza, “pelos meus cálculos, cerca de 1 milhão e 600 mil pessoas poderão ficar sem TV”.
Relativamente aos quase 8% de pessoas que não tencionam preparar-se para receber o sinal digital, número este precedido de um “apenas” no comunicado da ANACOM, o perito ainda é mais cáustico. “8% da população corresponde quase a Lisboa e Braga juntos e acham que é pouco?”, questiona. No entender de Sérgio Denicoli estamos perante uma “captura regulatória”. “A ANACOM tem a obrigação de divulgar e de proteger o regulado, não de servir os interesses da Portugal Telecom”, comenta, não considerando inócuo o súbito crescimento do consumo de canais por subscrição. “A despreocupação da ANACOM só pode ser uma manobra para servir interesses instalados”, reforça o investigador.
Por outro lado, Denicoli chama a atenção para a não divulgação dos valores dos subsídios atribuídos pela PT. “Se há um monopólio esses dados têm que ser públicos, é um absurdo que não o sejam”, referindo ainda que grande parte das pessoas não usufruiu destes apoios, sobretudo pela excessiva burocracia a eles associada. O perito prevê que a partir de dia 26 “os mais carenciados vão mesmo ficar sem televisão” e “que a PT vai oferecer cada vez mais pacotes promocionais para que adiram ao cabo”. “Está a tentar incutir-se na cabeça das pessoas que é preciso pagar para ter boa televisão e lamento muito todo este absurdo, mas não foi por falta de aviso”, aponta Sérgio Denicoli, que não tem conhecimento de qualquer outro país em que situações análogas tenham sucedido. “Portugal é o único em que existe uma ligação entre a TDT e a TV paga”, frisa.
Ao mesmo tempo, diz, “a tornar todo este processo ainda mais nebuloso está a mudança no sistema de audiências em simultâneo com a implementação da TDT”. E explica: “Não sabemos se os ajustamentos que estão a ocorrer se prendem ou não com a TDT”. Ora, atendendo ao target core da RTP1, Denicoli antevê que o canal é aquele “que mais vai continuar a perder”, tendo em conta a faixa da população que ficará sem TV. Aliás, “talvez estas medições já o estejam a reflectir, mas nunca vamos ter certezas”. O especialista acredita ainda que “há fortes implicações políticas por detrás de tudo isto”, rematando: “O processo da TDT foi conduzido para confundir e não para esclarecer”.
Denicoli denuncia ainda que, segundo uma lista divulgada pela ANACOM sobre a rede da TDT implementada pela PT até 13 de fevereiro deste ano, “52% dos 308 concelhos do país têm uma cobertura inferior aos 90,12% da população determinados pela Lei como cobertura mínima no Continente”. Deste total, reforça, “8% dos concelhos (25 municípios) têm uma cobertura que não atinge nem metade da população. Há casos, como os conselhos açorianos de Santa Cruz das Flores, Lajes das Flores e Corvo, onde não há qualquer sinal da TDT”. Para o especialista, “provavelmente a falta de cobertura em muitos municípios vai resultar na queda das audiências”. E “como a publicidade muitas vezes é calculada de acordo com o CPM (custo por mil telespectadores), isto terá reflexos nas receitas dos canais generalistas”, conclui.