Os britânicos a olhar para o passado
João Paulo Meneses na conferência ‘Radio 3.0’ (Londres, 21/05)Depois de um dos fundadores da Last.fm ter explicado o sucesso do projecto e como é que operadores sem história no negócio […]

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João Paulo Meneses na conferência ‘Radio 3.0’ (Londres, 21/05)Depois de um dos fundadores da Last.fm ter explicado o sucesso do projecto e como é que operadores sem história no negócio do áudio estão a ganhar muito dinheiro a partir da internet, alguém perguntou a Martin Stiksel se o Last.fm seria rádio. A questão é absolutamente irrelevante para Martin (que desempacotou uma resposta que já deu algumas vezes, relacionada com um alegado regresso às origens da rádio, feita, então, por verdadeiros amadores, que passavam o que gostavam…) e mostra como a indústria da rádio se sente desconfortável com os tempos que se vivem. Desconfortável significa várias coisas: incomodada, receosa, temerosa. Confusa, quando olha para o acessório.
Depois de tantas décadas assentes no pressuposto de que ‘eles [os ouvintes] querem o que lhes dermos’, as bases estão a ruir. E – como tive oportunidade de assistir a semana passada em Londres, numa conferência com os principais protagonistas da rádio na Grã-Bretanha – o desconforto é generalizado. Enquanto a Last.fm e projectos semelhantes estão a começar a ganhar dinheiro, a indústria da rádio não sabe o que fazer com a Internet. Sabe, isso sim, que aquilo que ali foi descrito como ‘a obsessão da publicidade pela net’ (19% de mercado contra 4% da rádio, números apresentados) está a ir para outros bolsos. E deu para perceber que um projecto pioneiro, dirigido à indústria clássica, ali apresentado (cliqradio.co.uk) foi recebido com muita desconfiança.
No caso da Grã-Bretanha o problema é ainda mais grave, porque aquilo que há 15 anos parecia uma óptima ideia – o DAB -, é hoje parte do problema e não da solução. Visto a esta distância, o DAB é apenas um FM melhor, mas na Grã-Bretanha têm sido gastos milhões nessa tecnologia – e há ainda um novo e ambicioso projecto, do Channel 4, para nascer. É verdade que se vende(ra)m muitos rádios DAB por lá, mas as audiências são ainda minoritárias e a publicidade atribuída a esses canais não compensa. O DAB continua a ser um mau negócio. Além do mais, enquanto pensam – e gastam, tempo e ideias – nessa tecnologia, não estão a investir em conteúdos para a internet. Não é por acaso que, à excepção da BBC, o panorama do web-conteúdo é fraco na Grã-Bretanha. Mas também não é por acaso que a BBC tem 60 por cento das audiências, contra 40 por cento da rádio comercial. A verdade – por muito que custe admiti-lo – é que a indústria não sabe o que fazer. Dá alguns passos tímidos, proporcionais ao desconforto, e vai vendo como evolui. A questão é que esse ritmo é muito mais lento do que aquele que é imposto por outros operadores, sem ligação à rádio, e que estão a fazer diversos negócios – como mostrou um dos fundadores da Last.fm (um dos maiores jornais da Europa, o Bild, tem um canal de rádio na net. Com quem? Com a Last.fm, claro).
De uma forma muito básica, diria que a rádio britânica está num buraco chamado DAB. O problema é que, em vez de encontrar a saída no local onde entrou, continua a escavar, à procura da luz ao fundo túnel. O túnel está cada vez mais escuro, e a rádio cada vez mais desorientada. Na conferência, um responsável por uma empresa de pesquisa ligada à bolsa, a Dresdner Kleinwort, aconselhou a investimentos de longo prazo, porque a rádio é resilenta (ou seja, a velha ladainha de comparar a internet com a televisão e a fé de que a história se repetirá).
Por isso, a conferência que se chamava ‘radio 3.0’, foi sobretudo sobre o que fazer com um problema chamado DAB.
É evidente que ‘radio 3.0’ era uma provocação, muito mais porque ainda está por consolidar uma ‘rádio 2.0’, mas, o que quer que seja, será sempre baseada na internet. Mais interactiva, mais apelativa ao consumo por parte do utilizador, mas também menos rádio. Será isso importante para a indústria – incluindo a portuguesa?
Só para quem olha o futuro pelo retrovisor.
Stiksel chamou ao Last.fm uma rádio personalizada. Parece claro que a segunda palavra ‘mata’ a primeira, mas deixem a semântica e a ontologia dos termos para quem estuda a coisa. Aproveitem os tempos actuais para evoluir, para encontrar os públicos onde eles estão. E eles estão cada vez mais à volta do mundo digital.
Uma nota final: o que é que explica que um excelente projecto chamado Cotonete não esteja já ao serviço – convergente – das rádios da Media Capital?
João Paulo Meneses
Jornalista da TSF e investigador