It’s not creative unless it sells

João Paulo Luz, diretor de negócios digitais e publishing da Impresa
Já em meados do século passado David Ogilvy, para muitos a primeira grande figura da indústria da publicidade, afirmava que a função da publicidade é vender e que publicidade eficaz tinha que se basear no conhecimento do seu consumidor. 70 anos depois, seria curioso imaginar a sua reação perante a nossa atual realidade, com a quantidade de informação acumulada sobre os consumidores e o foco na medição sobre a venda que hoje as plataformas digitais proporcionam.
Não nos deveremos, assim, surpreender que o mercado esteja tão entusiasmado com estas capacidades e que tenda, num exercício de simplificação, a resumir a oportunidade da comunicação digital àquilo a que nos habituámos a designar por performance. Seguindo um raciocínio lógico, se comunicamos para vender, e há uma disciplina que nos promete que comunicamos investindo apenas o que o acréscimo de vendas nos permite em termos orçamentais, é nessa disciplina que nos deveremos centrar. Mas será que é assim tão simples? Talvez não.
A primeira dúvida é se estamos a avaliar bem o acréscimo de vendas registado. As vendas são, por natureza, voláteis e isso impede que seja inequívoco identificar o aumento de vendas obtido. É aí que entram os modelos de atribuição mas, quando aprofundamos, percebemos que têm sempre critérios que nunca poderão ser 100 por cento objetivos. O last click é objetivo mas é insuficiente para identificar o mérito e o real impacto da comunicação. Se considerarmos que a campanha de performance também deve reclamar como mérito seu quem comprou, desde que impactado pela campanha nos últimos sete ou 28 dias, os períodos mais habituais, estaremos a aumentar a qualidade da análise mas estaremos também a enviesar conclusões. Nesse período, quase sempre existiram outras ações da marca que também poderiam reclamar a mesma contribuição e todo o fluxo orgânico que já existiria mesmo sem a campanha. Quando aplicamos esses critérios ao cálculo do CAC (customer acquisition cost), poderemos estar a ser francamente otimistas, mas quem não gosta de mostrar dashboards que reconheçam o sucesso do que fazemos e, ainda por cima, se pertencerem a entidades que se tornaram a referência.
A segunda dúvida é que a comunicação é muito mais do que a conversão, porque sabemos que a notoriedade e os atributos da marca ajudam à venda, bem como as variações de preço, nossas e dos concorrentes. Consciente de que construir e reforçar o valor de uma marca é igualmente um objetivo da publicidade, a resposta do mercado levou à coexistência de dois tipos de campanhas com objetivos distintos. Uma para conversão, quase exclusiva do digital, e outra para “awareness” ou reforço do valor da marca. O erro, a existir, poderá estar em que ambas promovem a venda, apenas medimos o seu sucesso de forma diferente e, mais importante, incidem sobre potenciais consumidores diferentes.
E este último aspeto deverá ser aquele que mais deveremos tentar conhecer. Se o modelo de atribuição tem que ser entendido para ser corretamente interpretado, é ainda mais importante percebermos que a imensa “data” de que dispomos, se utilizada a favor da otimização sucessiva de um CAC cada vez mais baixo, nos vai deixar a falar apenas com os que já tinham uma elevada afinidade à nossa oferta e, nos piores casos, já nos comprariam mesmo sem lhes comunicarmos mais esta vez. É por isso que, quando se interrompem campanhas de performance, a quebra de vendas é sempre menor do que o número de vendas habitualmente reclamadas pelos reports de performance.
Se tivermos essa consciência entenderemos que a performance acelera os ciclos de compra, o que é ótimo para qualquer negócio, mas deveremos ser cautelosos nas conclusões a retirar das nossas análises. E a principal é tentar identificar o equilíbrio correto entre os orçamentos destinados a performance e os destinados à comunicação que incide sobre aqueles que, sendo potenciais consumidores nossos, mas que estando num momento mais distante da aquisição imediata, são aqueles que nos alimentam o crescimento e que trazem os indispensáveis novos clientes.
Calculo que David Ogilvy ficaria maravilhado com o que o mercado hoje possibilita mas duvido que partilhasse do mesmo entusiasmo sobre a alocação de recursos destinados à performance face aos colocados a favor do valor da marca. Sem marcas de valor os produtos e serviços tornam-se indiferenciados, só permitindo competir pelo preço. E quando olhamos para a maior parte dessas campanhas que nos impactam por retargeting não podemos deixar de nos lembrar de outra frase dele:
“You cannot bore people into buying your product – you can only interest them in buying it.”
Artigo de opinião assinado por João Paulo Luz, diretor de negócios digitais e publishing da Impresa