Observador tem novo projeto áudio para entrar no segmento dos podcasts narrativos
Estará no ar a partir da próxima terça-feira o Podcast Plus, um novo projeto áudio do Observador para a produção de podcasts narrativos, formato que faz convergir jornalismo, investigação e entretenimento e que, nos últimos anos, tem vindo a ganhar expressão noutros mercados.
“Este formato já é um sucesso enorme noutros países, nos EUA o top 10 de podcasts tem programas de informação, humor/entretenimento e narrativos, sendo o Serial talvez o maior sucesso, já na sua terceira temporada e com mais de 340 milhões de downloads nas duas primeiras”, enquadra Rudolf Gruner. “O que faltava era oferta produzida em Portugal e a razão principal será o elevado investimento – custo, tempo e recursos envolvidos – que é necessário para produzir este formato”, aponta o diretor geral do Observador, embora sem revelar números concretos, mas adiantando ao M&P que esta aposta pretende assumir-se como “uma entrada mais musculada na área do entretenimento”.
A estreia no formato será concretizada com O Sargento na Cela 7, a primeira série no âmbito deste projeto, onde será contada a história de António Lobato, o militar português que passou mais tempo em cativeiro durante a guerra de África, numa produção narrada pelo ator Pêpê Rapazote e com banda sonora original criada pelo músico Noiserv.
Com seis episódios, a série, que acompanha a história do piloto da Força Aérea Portuguesa que foi capturado em maio de 1963 na Guiné pelo PAIGC e passou sete anos e meio preso, narra também a história da operação secreta e clandestina lançada em 22 de novembro de 1970, com o nome de código Operação Mar Verde, e que resultou na libertação de António Lobato e de outros 25 prisioneiros de guerra portugueses. Uma operação polémica que culminou com a condenação de Portugal nas Nações Unidas por se ter envolvido num ataque a um país estrangeiro sem declaração de guerra.
A série, a primeira de cinco neste formato que o Observador prevê lançar até ao final de 2023, estará disponível numa nova área do site dedicada a este tipo de conteúdos, nas plataformas de streaming de podcasts e será também emitida na antena da Rádio Observador, avança Rudolf Gruner, que antecipa, em entrevista ao M&P, o que esperar da aposta neste formato, como irá evoluir o projeto e quais as expectativas, também, do ponto de vista da sua exploração comercial.
M&P: Este novo projeto na área do áudio terá como eixo central o desenvolvimento de séries áudio que juntam informação e entretenimento, os chamados podcasts narrativos. Apesar de já ter expressão noutros mercados, este é um formato que ainda não tem sido muito explorado em Portugal, talvez com com exceção de meios mais alternativos como a Divergente ou Fumaça. Acreditam que o formato terá adesão entre os ouvintes portugueses?
Rudolf Gruner (RG): Acreditamos que sim. Este formato já é um sucesso enorme noutros países, nos EUA o ranking top 10 de podcasts tem programas de informação, humor/entretenimento e narrativos, sendo o Serial talvez o maior sucesso, já na sua terceira temporada e com mais de 340 milhões de downloads nas duas primeiras temporadas. Mas também noutros países este formato tem tido grande sucesso. Por exemplo, no Brasil, a Mulher da Casa Abandonada, da Folha de São Paulo, foi um fenómeno viral, alcançando rapidamente mais de sete milhões de downloads. Muitos destes conteúdos já são ouvidos por consumidores portugueses. O que faltava era oferta produzida em Portugal e a razão principal será o elevado investimento – custo, tempo e recursos envolvidos – que é necessário para produzir este formato. O Observador é líder no áudio on demand, por isso é um passo natural sermos agora os primeiros a apostar neste formato. Para o Observador, constitui também uma entrada mais musculada na área do entretenimento.
M&P: Apesar de contarem com um projeto de rádio, a vossa aposta no áudio tem passado muito pelo formato podcast. Esta é uma área de negócio onde identificam maior margem e potencial de crescimento, até por comparação com a rádio no seu sentido mais tradicional em antena?
RG: Sem dúvida. Na rádio/áudio, como na televisão/vídeo, a tendência estrutural é de migração do consumo offline para digital e de linear para on demand. De acordo com o estudo Reuters Digital News Report, em 2021, nos segmentos etários até aos 44 anos, o consumo áudio on demand já era superior ao linear (no segmento 18-24 o consumo linear tinha 20% de penetração e o consumo on demand 72%) e a migração está a evoluir muito rapidamente. No caso do Observador, é a existência de uma programação linear que nos permite ter uma produção alargada de conteúdos on demand. Temos hoje mais de 50 programas de podcast diferentes, entre diários e semanais, com uma grande diversidade de temas, desde a politica à economia, desporto, cultura, etc. Somos o publisher nacional com mais presenças no ranking top 100, com cerca de 3,5 milhões de downloads por mês, por mais de um milhão de utilizadores. O passo que estamos a dar agora, que na verdade já tínhamos iniciado com A História do Dia, é de começar a produzir conteúdos podcast pensados em primeiro lugar para consumo on demand, mesmo que depois tenham também presença em antena.
M&P: Que tipo de conteúdos podemos esperar do Podcast+? Arrancam com uma série em seis episódios mas referem ter já outras em produção. Quando preveem alargar a oferta de conteúdos do projeto Podcast+?
RG: Até ao final do ano, o Observador vai lançar cinco séries em podcast, para ouvir em vários episódios, com temas muito diferentes entre si. Neste momento, as cinco séries já estão em desenvolvimento, encontrando-se em fases diferentes do processo de produção. O Sargento na Cela 7 estreia a 14 de março e terá seis episódios, ou seja, termina a 18 de abril. A segunda série estreará a meio de maio.
M&P: Esta primeira série conta com vários parceiros, da narração à banda sonora, passando pelo grafismo. Como é o processo de produção? Quanto tempo demora a produzir um conteúdo deste tipo e qual o custo que pode atingir o desenvolvimento de um podcast com estas características?
RG: Sim, O Sargento na Cela 7 tem narração do ator Pêpê Rapazote e banda sonora original de David Santos, conhecido pelo nome artístico Noiserv. Foram precisos vários meses para realizar este projeto. Ao longo de cinco meses, foram feitas mais de 17 horas de entrevistas: com o protagonista, com outros prisioneiros de guerra, com intervenientes diretos na Operação Mar Verde, entre outros. A escrita do guião demorou perto de dois meses e a sonorização e pós-produção áudio dos seis episódios durou cerca de dois meses e meio.
M&P: Qual o investimento envolvido no lançamento deste projeto até agora?
RG: O investimento neste projeto tem duas componentes. Por um lado, os recursos internos que participaram no projeto, e foram muitos, desde os jornalistas que investigaram e reconstruiram a história, fizeram as entrevistas, aos sonoplastas que fizeram o design sonoro, à direção editorial que acompanhou de perto todos os passos, às equipas de multimédia e de redes sociais que estão a preparar todo o trabalho de divulgação e promoção, à equipa técnica que criou a nova área do site que vai alojar o Podcast Plus e, finalmente, a equipa comercial que apresentou o projeto ao mercado e fez o acordo com o patrocinador, a Honda. Por outro lado, os recursos externos, no caso desta primeira série temos a narração feita pelo Pêpê Rapazote, a banda sonora pelo Noiserv e a art cover pela agência Ophelia. Vamos, obviamente, dar uma grande visibilidade ao Podcasts Plus em todos os nossos meios.
M&P: O Observador fez recentemente um reforço de capital de cerca de um milhão de euros. Foi feito com vista ao financiamento deste projeto?
RG: O Observador já fez alguns reforços de capital ao longo dos nossos nove anos de vida, com o objetivo de financiar a atividade, uma vez que ainda não atingimos o break-even, e de nos permitir investir no crescimento e desenvolvimento do nosso projeto. Este aumento de capital mais recente enquadra-se na mesma filosofia. A parte de investimento será principalmente canalizada para a rádio/áudio, com este projeto Podcast Plus, para a expansão da cobertura FM e também para a criação de novos canais temáticos, como é o exemplo do recente projeto de saúde mental.
M&P: Falou já numa parceria com uma marca, a Honda. Do ponto de vista da operação comercial, quais as expectativas para este projeto? Referem que o podcast narrativo apresenta um potencial significativo para as marcas. De que forma irão explorar comercialmente estes conteúdos e como será feita essa integração das marcas no formato?
RG: A Honda é o nosso parceiro exclusivo em 2023 para as cinco primeiras séries de Podcast Plus. Portugal já é um dos países com maior penetração de podcasts no mundo. Segundo o mesmo estudo Reuters Digital News Report, em 2021, 42% dos portugueses ouviram pelo menos um podcast no último mês vs. 37% nos EUA. Em 2019, essa percentagem, em Portugal, era 34%. Está a crescer muito rapidamente. Nos EUA, em 2022, o investimento publicitário em podcasts ultrapassou os dois mil milhões de dólares e estima-se que ultrapasse os quatro mil milhões de dólares em 2024, é claramente o formato digital que cresce mais rápido. Em Portugal não há dados oficias mas creio que o valor será ainda inferior a um milhão de euros, portanto a margem de crescimento é enorme. Sentimos nos últimos meses um interesse crescente dos anunciantes por este formato, que é comprovadamente dos mais eficazes para os objetivos de comunicação das marcas.
M&P: Quanto pode custar a um anunciante a presença neste tipo de formato?
RG: Não revelamos publicamente… mas temos outras oportunidades disponíveis nos mais de 50 podcasts que já fazemos em diferentes áreas temáticas e que estamos a apresentar ao mercado.
M&P: De que outras formas pretendem monetizar a distribuição destes conteúdos? Serão de acesso pago, exclusivamente suportados por publicidade ou terão um modelo de negócio misto?
RG: Pelo menos numa fase inicial, os Podcast Plus serão de acesso gratuito, mas é possível que, com o tempo, a estratégia possa vir a ajustar-se. As assinaturas do Observador são um elemento fundamental da nossa visão estratégica de médio-longo prazo, já valem hoje mais de 20% da nossa receita e é evidente que só conseguiremos crescer rapidamente neste valor se continuarmos, cada vez mais, a acrescentar conteúdos exclusivos e melhorar a proposta de valor. Ao longo do tempo temos vindo a fechar cada vez mais conteúdos para os assinantes. Os podcasts, até agora, têm ficado abertos mas isso pode vir a mudar no futuro. Até pode não passar necessariamente logo pelo fecho integral dos conteúdos, mas por dar mais conteúdo exclusivo ou em tempo antecipado.