ChatGPT is the next big thing

João Paulo Luz, diretor de negócios digitais e publishing da Impresa
A digitalização das nossas vidas foi imensa nos últimos 30 anos. Recordamos a transformação das nossas formas de trabalhar com a chegada das folhas de cálculo, dos processadores de texto e das apresentações em powerpoint no início dos anos 90. A nossa produtividade teve um enorme impulso, acelerado mais tarde pela utilização da internet, que veio permitir que nos correspondêssemos por email e que pesquisássemos tudo o que se acumulava na web através de motores de pesquisa.
A forma como trabalhávamos mudou, como mudou a forma como comunicávamos com o instant messaging, com as vídeo chamadas, inicialmente sem sucesso, com os telefones que as permitiam em 3G, e sobretudo com as redes sociais. Passámos a comunicar com muito mais facilidade, a recuperar amizades que, de outra forma, se iriam tornando distantes e passámos a conhecer pessoas virtualmente.
A chegada do iPhone trouxe estas adoções para um uso absolutamente impensável, fazendo estas novas formas de conviver, comprar e trabalhar dominantes e sem restrições horárias. Mais tarde o 4G permitiu que a Uber mudasse em definitivo também a forma como nos movemos e a pandemia impulsionou tudo isto de um modo surpreendente mesmo para os adeptos mais convictos.
Hoje não temos dúvidas de que o saldo é muito positivo, embora se tenham sempre identificado imensos perigos para a sociedade e para o nosso bem estar ao longo de muitos destes profundos impactos. No entanto, até hoje a discussão fazia-se com uma ideia mais ou menos conhecida do que estava em causa. Não era difícil de entender cada inovação, e se havia sempre quem avisasse que as relações pessoais, as democracias e os modelos em que trabalhamos estavam a evoluir para algo que seria pior no longo prazo, também havia quem fervorosamente defendesse que nunca pudemos viver tão bem. Como quase sempre, uns e outros tinham pontos válidos e a discussão fazia-se com um claro entendimento sobre o que cada nova oferta adicionava às nossas vidas.
Se o metaverso reacende todas as discussões, a mudança sobre o entendimento da inovação dá-se com o blockchain. São muitos os que passaram a falar de criptomoedas, e mesmo a transacioná-las, mas são muito poucos os que entendem e conseguem explicar o que é o blockchain e porque tem tão grande potencial. E tudo se agudiza ainda mais com os primeiros produtos de inteligência artificial acessíveis ao público. A complexidade do que está em causa não permite que se formulem opiniões com facilidade e temos a ideia de que a tecnologia vai evoluir sem grande controlo, o que é tão facilitador como preocupante.
Não está em causa a evidente utilidade destes novos produtos. A diferença entre fazer pesquisas no Google ou perguntar ao ChatGPT é já tão impressionante que não é difícil prever que estamos perante um “game changer”. Ao mesmo tempo, desafiar a criatividade do DALL.E, que cria imagens de acordo com um briefing nosso, é no mínimo a segunda geração de procurar imagens no Google que se aproximem do que queremos ilustrar.
Até na forma como estão a ser disponibilizados, estes produtos são diferentes dos seus antecessores. A gratuitidade tem sido o motor da adesão de tudo o que conhecemos no mundo digital, salvo as exceções do e-commerce. Estes produtos de IA, ou confiantes da sua superioridade ou porque ainda não resolveram os desafios da massificação, apresentam-se como tendencialmente pagos ou, pelo menos, com fortes limitações no seu uso gratuito.
Os preços de 9,99 euros por semana, 29,99 euros por mês e 59,99 euros por ano, para uma ferramenta tão nova como o ChatGPT, quererão significar uma dessas duas razões ou ambas. Mas são, sem dúvida, um sinal de que estes produtos são “the next big thing”.
As “falhas” que ainda exibem que a sua “inteligência” ainda é muito limitada, dando origem a posts nas redes sociais com as ridículas respostas do ChatGPT às questões que nos habituámos a colocar às crianças, em que a pergunta não faz sentido ou já tem a resposta incluída, e que motivam as exclamações de que “os nossos empregos estão a salvo”, mostram paradoxalmente que todos estamos a identificar o seu impacto.
Não conseguindo entender como funcionam de facto estes produtos, pela sua complexidade, dificulta formularmos uma opinião sobre os eventuais cuidados que deveríamos ter com o seu desenvolvimento.
Mas se há algo que já sabemos é que não é a tecnologia que nos obriga a tornarmo-nos superficiais no conhecimento dos temas mas ainda assim a formular opiniões fortes, embora tenhamos consciência do perigo que isso encerra para as sociedades democráticas que temos como a melhor forma de nos organizarmos. Somo nós que escolhemos, como escolhíamos quando acedíamos ao conhecimento apenas pela academia, pelos livros, pelos jornais ou pela TV. Nessa altura, muito se dizia sobre o quarto poder, parecido com o que hoje se diz sobre as redes sociais.
E, se tudo isso é verdade, faz sentido que nos assustemos com uma sociedade em que as máquinas estão já a ser capazes de “pensar” e os homens estão cada vez mais confortáveis em se esforçar menos para poder pensar melhor. No entanto, não é a tecnologia que devemos culpar, até porque ela não se vai travar por causa disso. A solução está, como sempre, na forma como vamos ser capazes de a utilizar a favor do bem.
Artigo de opinião assinado por João Paulo Luz, diretor de negócios digitais e publishing da Impresa