Voltamos ao mesmo

Ricardo Tomé, director coordenador da Media Capital Digital e docente na Católica Lisbon School of Business and Economics
Pronto. É oficial. Depois de o Instagram andar a testar a solução, eis que também o Facebook a vai introduzir. Ambas as plataformas usaram as contas de amigos e marcas que nós decidimos seguir para decidir os posts dessas páginas e pessoas a mostrar. Mas agora, numa resposta à popularidade do TikTok e do seu For You Page, introduzirão o Home, que passa a incluir sugestões de posts/conteúdos de pessoas e páginas que não seguimos. Voltamos à mesma pergunta: quem e por que me escolhem isto?
Atenção que já mantínhamos a pergunta no Google e no TikTok. Ela simplesmente se renova. E aos utilizadores ela mantém-se inalterada e com respostas dadas que sempre soam suspeitas. A cada anúncio “recomendado” e que parece ter tido influência de um qualquer esquema de escutas dos microfones do telemóvel a fórmulas matemáticas dignas de um Nobel, já todos ouvimos tanto que no final sobra apenas uma coisa: desconfiança.
Do outro lado da balança, dirão outros que, se a experiência for boa e as recomendações valorizadas, basta ver os números do TikTok e perceber que o modelo funciona e ninguém quer saber por que nos dão aquilo nem como conjugam dados, desde que seja bom.
Mas lembremos como ainda recentemente tivemos o exemplo contrário. Escândalos como o da Cambridge Analytica a aterrorizar os utilizadores sobre o uso de informação pessoal sensível. E com isto (entre outros) a consequência veio com mais pressão pública e mais regulação, desde logo com diretivas como a do ePrivacy e o RGPD e o fim dos cookies. Mas não só. Do lado concorrencial, a Apple ergueu a bandeira e, a cada nova instalação de apps nos seus iPhones e iPads, agora obriga os developers a perguntar-nos se queremos deixar que a app nos “siga” e forneça anúncios personalizados, com mais de 20 por cento dos utilizadores a responderem “Não”.
A necessidade ou pertinência da personalização não está em causa. Mas sim a falta de transparência de como ela é feita. Aliás, a mesma já vinha com o TikTok. E receio que a empresa de Zuckerberg, face a melhorias recentes nas suas plataformas mal trabalhadas e comunicadas, possa novamente estar a cair em igual armadilha – querer melhorar um serviço sem acautelar porque o faz, como o faz, e se tal deveria ou não ter a opção do utilizador envolvida.
Enquanto eu controlo (ou acho que controlo, o que é de mestre, dar a “sensação” desse controlo) o meu feed, percebendo que me fornecem conteúdos com base nas minhas escolhas das pessoas que sigo, a partir do momento em que me mostrarem pessoas novas que não sigo com base nas que eu sigo… Bem, dizer que isto é parecido é só um assobio para cima e um empurrar para a frente com um eventual problema a surgir mais dia menos dia.
O TikTok tem um problema mas menor, porque já nasceu assim, e cresceu assim, debaixo dessa suspeita e dessa mecânica. A Meta não. Cresceu a pedir a confiança dos utilizadores, a prometê-la e a falhar com a promessa. E ao que parece não aprendeu ainda a lição. Veremos as próximas semanas e como a empresa sediada em Menlo Park irá fazer este rollout – do ponto de vista técnico sim, mas sobretudo do ponto de vista da comunicação, explicação e detalhe. Se Zuckerberg e Cia. não recuperarem o maior ativo de qualquer empresa, a Meta e os investidores estarão sempre de pé atrás, já para não falar nos utilizadores; e esse ativo é só um e mais valioso do que qualquer algoritmo: chama-se “Confiança”.
Artigo de opinião de Ricardo Tomé, diretor coordenador da Media Capital Digital e docente na Católica Lisbon School of Business and Economics