Ricardo Cabornero, diretor de conteúdos da Prime Video para Espanha e Portugal, sobre os planos de produção para o mercado nacional, e Julio Casal, CEO da Ficción Producciones,
“Estamos abertos a considerar produtos 100 por cento portugueses”
Operação Maré Negra é a mais recente aposta da plataforma Amazon Prime Video envolvendo o mercado português. O responsável ibérico pelos conteúdos, Ricardo Cabornero, assegura que está disponível para aumentar […]
Rui Oliveira Marques
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Operação Maré Negra é a mais recente aposta da plataforma Amazon Prime Video envolvendo o mercado português. O responsável ibérico pelos conteúdos, Ricardo Cabornero, assegura que está disponível para aumentar a presença de conteúdos nacionais na plataforma. O galego Julio Casal, CEO da produtora responsável pela nova série, defende o modelo das coproduções
Um submarino artesanal que atravessa o Oceano Atlântico com três toneladas de cocaína e três homens a bordo. É este o ponto de partida para a nova série da Amazon Prime Video, que já estreou na plataforma e chega à RTP1 a 14 de março, e que ilustra como as plataformas de streaming estão a olhar para oportunidades de produção que envolvam o mercado nacional. No dia de apresentação de Operação Maré Negra, em Lisboa, o M&P esteve à conversa com Ricardo Cabornero, diretor de conteúdos da Prime Video para Espanha e Portugal, sobre os planos de produção para o mercado nacional, e com Julio Casal, CEO da Ficción Producciones, a propósito do percurso percorrido pela indústria audiovisual galega.
Meios & Publicidade (M&P): O que tem de especial a história da Operação Maré Negra para terem decidido avançar com o financiamento à sua produção?
Ricardo Cabornero (RC): Parece-nos uma história interessante para os clientes de Portugal e Espanha, apesar de ser uma história que podia ter ocorrido em qualquer país. Parte de um facto incrível, extraordinário, que é o atravessamento do Atlântico num submarino. É uma história inspirada em factos reais, que combina vários géneros, como thriller, aventura épica e drama. Pensámos que era uma oportunidade muito interessante para fazer esta produção em Espanha, mas, além disso, vimos que era uma história internacional que tem, de forma natural e orgânica, uma relação com Portugal porque se trata de uma operação policial entre os dois países.
M&P: Este processo foi liderado desde o início pela Amazon?
RC: Tudo surge a partir dos nossos parceiros da Ficción Producciones. Não é uma produção original da Amazon, nem está supervisionada a 100 por cento pela Amazon. É uma coprodução, com vários sócios. O centro de tudo é a Ficción Producciones, que é quem nos oferece a oportunidade de participar no projeto. É um modelo que nos parece inovador e interessante porque permite à Amazon entrar no projeto de forma flexível, não temos de financiar o projeto todo.
M&P: Na Operação Maré Negra, quem pagou quanto para que fosse viável avançar?
Julio Casal (JC): Lidera, maioritariamente, a Amazon, mas está comparticipado pela televisão pública portuguesa e por vários canais regionais espanhóis, entre eles a TV Galicia. No âmbito do financiamento europeu, achamos que é uma fórmula muito interessante para todas as partes porque permite termos mais orçamento. Ao mesmo tempo, os agentes, os canais e as plataformas minimizam o risco e não precisam de assegurar 100 por cento do orçamento. Tem a complexidade de ir buscar as histórias que se adaptem a este modelo e implica ter todas as partes alinhadas, mas é muito interessante porque permite melhores resultados de produção.
M&P: A Ficción Producciones já tem experiência em coproduções internacionais, como é exemplo a recente série 3 Caminhos, que também envolveu a RTP. Neste momento têm mais séries em pré-produção ou em produção que tenham esta lógica de envolver parceiros de vários países?
JC: Sim. A fórmula que aplicamos agora com a Amazon tem muito futuro, apesar de não deixarmos de fazer projetos exclusivos para um canal ou para uma plataforma. Já tínhamos trabalhado antes com Portugal, por exemplo, com A Espia e com outras minisséries para a RTP, mas esta é uma oportunidade muito natural. Por isso é que estamos a trabalhar com a mesma fórmula noutros projetos, tanto em cinema, como em séries para televisão.
M&P: Não há o perigo de o espectador se cansar de séries onde a questão da fronteira está sempre presente ou em que o elenco é composto por atores portugueses, espanhóis e galegos?
JC: Penso que não. A inovação neste tipo de séries é que são rodadas nas línguas oficiais. Daí que os atores portugueses falem em português ou os galegos em galego. De alguma forma, a identidade cultural mantém-se e as histórias são contadas de uma forma próxima. Há também uma mistura de técnicos e de atores que são, internacionalmente, de referência e que podem trabalhar juntos.
M&P: O El País escreveu há três semanas, a propósito deste boom de séries de coprodução ibérica, que a “ficção televisiva portuguesa é cada vez mais internacional graças às coproduções e a sua especial aliança com a indústria espanhola”. Não devia ser antes destacada a aliança especial com a indústria galega? O que tem de especial a Galiza para que nos últimos anos, do ponto de vista audiovisual, esteja muito forte?
JC: A televisão autónoma da Galiza foi uma das primeiras a ser criada em Espanha, o que gerou uma série de técnicos a nível regional que depois foram trabalhar a nível nacional. A dada altura, vários diretores dos canais nacionais eram provenientes da televisão autónoma galega. Graças a essa oportunidade, o setor audiovisual foi considerado muito importante e foi declarado, inclusive, por lei setor estratégico. Tudo isto permitiu desenvolver o setor. Hoje em dia já não será assim, porque todas as autonomias têm a sua televisão e a própria Galiza é uma região autónoma relativamente pequena, comparada com Andaluzia, Madrid ou Catalunha. Mesmo assim, temos um posicionamento muito forte a nível nacional e internacional. Acrescento que a relação histórica da Galiza com Portugal é muito natural. Em Portugal trabalhamos comodamente.
M&P: Em que momento é que o governo regional apostou na indústria audiovisual?
JC: Tudo parte de uma lei de 1999 aprovada no Parlamento da Galiza. A partir daí sempre houve relações com Portugal, com uns encontros na Embaixada de Espanha em Lisboa para unir os setores dos dois países. Penso que a Galiza sempre liderou essa relação. Todos os anos há um encontro entre Galiza e Portugal para promover a coprodução. Por exemplo, coproduzimos A Espia graças a esse encontro.
M&P: Em Espanha, várias análises colocam a Amazon em segundo lugar no ranking das plataformas de streaming, a seguir à Netflix. Qual é a realidade em Portugal? Quantas pessoas é que poderão ver a Operação Maré Negra a partir da Amazon em Portugal?
RC: Não partilhamos dados concretos por questões de política corporativa. A verdade é que estamos aqui há relativamente pouco tempo. No ano passado lançámos a subscrição Amazon Prime, que inclui o Prime Video e os envios gratuitos através da Amazon. Agora estamos numa fase de não nos preocuparmos em comparar, mas sim em que o nosso serviço e catálogo cresçam. Estamos muito centrados no cliente e em que os clientes percebam que têm um catálogo personalizado para Portugal. Estamos nesta fase a fechar acordos com estúdios americanos para termos mais filmes de estreia. Começamos a trabalhar com distribuidores locais em Portugal. Estamos atentos a oportunidades, como foi o caso da Operação Maré Negra, para fazer investimentos em produtos que se destaquem e que sejam diferenciadoras.
M&P: Está ativamente à procura de outras coproduções ibéricas ou prefere conteúdos 100 por cento locais?
RC: Estamos abertos às duas situações. É verdade que gostamos muito do modelo da Operação Maré Negra porque permitiu fazer uma produção maior que envolveu os dois territórios, mas também estamos abertos a considerar produtos que sejam 100 por cento para Portugal. Obviamente que a parte económica é diferente, porque o investimento não é rentabilizado tão rapidamente como numa coprodução internacional. Estamos numa fase em que a nossa obsessão é personalizar e ter um catálogo adaptado a Portugal.
M&P: Mas sentem que os produtores e os criadores portugueses querem muito trabalhar convosco?
RC: (risos) Sim. Há muita expetativa. A verdade é que temos uma barreira pelo facto de o nosso escritório de conteúdos estar baseado em Espanha. Não temos, ainda, um escritório da Prime Video em Portugal. Vemos a nível europeu que há uma procura pelas grandes produções internacionais, mas também vemos que é imprescindível e crítico ter produções locais. Em Portugal constatámos e vimos com esta produção que há equipas muito profissionais, mas depois a ambição não é a mesma que em Espanha, tal como em Espanha não é igual à de países maiores. Estamos a ver como usar todo este talento e indústria que já existem para podermos adaptar aos nossos interesses.
M&P: Recentemente anunciaram em Espanha um conjunto de documentários originais ligados ao desporto. De que tipo de conteúdos locais estão à procura?
RC: Está no ADN de todas as linhas de negócio da Amazon ter conteúdos para todos. Isso quer dizer que trabalhamos no sentido de ter um catálogo com uma variedade ampla, começamos pelo mais óbvio que era ter séries de ficção e filmes, mas queremos ser “o” serviço de televisão dos nossos clientes. Isso implica ir alargando a nossa oferta a outros géneros. Entrámos nas séries de entretenimento, nas séries documentais, incluindo este subgénero de séries documentais sobre desporto. Neste sentido, a ficção e cinema são importantes, mas estamos a explorar outros géneros.
M&P: 2022 será o primeiro ano em que vai funcionar a nova Lei do Cinema e do Audiovisual em Portugal que determina que as plataformas tenham de fazer produção local. Como vê este tipo de leis que, aliás, são comuns a toda a Europa?
RC: Na equipa de conteúdos estamos à espera que a equipa de public policy veja como se concretiza para, a partir daí, adaptarmo-nos e cumprirmos essas obrigações. Enquanto isso, vamos trabalhando naquilo que é a procura dos clientes. Ter obrigações de produção local está, em princípio, em linha connosco no sentido de que tentamos, quando lançamos Prime Video em cada país, priorizar o conteúdo local. Por exemplo, há estudos que dizem que a Prime Video foi o serviço de streaming que estreou mais produções espanholas em 2021.
O caminho da Amazon com pegada em Portugal
Foi a primeira aposta da Amazon envolvendo a produção nacional. Em Janeiro de 2021 estreou na Amazon Prime Video a série 3 Caminhos, criada pela Ficción Producións, que contou com o financiamento da TV Galicia e do governo regional da Galiza, assim como da estação pública portuguesa RTP, e coprodução da portuguesa Cinemate e da alemã Beta Filme. A apoiar a produção esteve também a Amazon Prime Video, que a disponibilizou no seu catálogo como conteúdo Amazon Exclusive. A série, que tem como pano de fundo o Caminho de Santiago, foi gravada no México, Portugal, Alemanha, Coreia do Sul e Espanha. Dois meses após a estreia na Amazon, 3 Caminhos começou a ser exibida na RTP1.
Os quatro episódios da série Operação Maré Negra estrearam na Prime Video em Espanha, Portugal e Brasil no dia 25 de fevereiro e chegam à RTP1 a 14 de março. A produção foi liderada pela Ficción Producciones, contando, além da Amazon e da RTP (com o apoio da Ukbar Filmes, Pandora da Cunha Telles e Pablo Iraola), com financiamento de sete canais regionais (CCMA, CRTVG, SAMC, EITB MEDIA, TVPC, RTPA e IB3), num processo liderado pela galega TVG.