Sobre as (actuais) 5 fases do marketing
Para quem estuda ou trabalha na área de Marketing é clara a sua evolução ao longo dos últimos anos, claramente acompanhando a própria movimentação dos mercados e as consecutivas alterações dos gostos, necessidades e desejos dos consumidores.
Até ao começo de 2021, estavam identificadas quatro diferentes fases evolutivas do Marketing. Em meados deste ano, Kotler, Kartajaya e Setiawan lançam um novo livro, no qual revelam os resultados das experiências e investigações várias encetadas quer por empresas, quer por investigadores do mundo inteiro. Este livro identifica uma quinta fase – Marketing 5.0, Tecnologia para a Humanidade.
Revendo as anteriores fases e evidenciando que as mesmas não se autoexcluem, o Marketing 1.0 é conotado com a era da Venda; tendo esta fase começado aquando da Revolução Industrial, a principal preocupação dos marketers da época residia no Produto. Era necessário garantir um padrão de qualidade inalterado nos bens produzidos e dar a conhecer as suas características e benefícios; de facto, não havia qualquer preocupação com o consumidor em si e acreditava-se que qualquer bem, desde que reunindo características percebidas como uma mais-valia pelo cliente, seria por este adquirido. A frase que melhor resume esta dita primeira fase, foi mencionada por Henry Ford: “Eu posso vender qualquer carro, desde que seja um Ford, Modelo T, de cor preta”.
Com o crescimento do número de empresas e consequente aumento de concorrência, os gestores rapidamente perceberam que precisavam olhar para o cliente e colocá-lo no centro da sua estratégia de negócio; o conceito Diferenciação surge pela primeira vez, assim como a necessidade clara de dar mais alternativas aos clientes. Não obstante, mantinha-se o foco no produto.
Em finais de 2012, novamente fruto de uma cuidadosa análise dos mercados e das empresas, identifica-se uma terceira fase: o Marketing dos Valores. Consumidores exigentes, mais bem informados, tornaram crucial a aposta na melhoria da sua experiência de compra; ao mesmo tempo, as marcas entenderam que teriam de acompanhar duas grandes tendências globais: consciência ambiental e responsabilidade social. Os consumidores preferiam as marcas que actuassem revelando sérias medidas de redução do impacto ambiental da sua atividade e que se envolvessem de forma séria em abraçar causas sociais. Mas, continuavam a prestar atenção ao produto em si e a claros indicadores de diferenciação por parte das marcas.
2017 foi o ano em que, face a um crescimento exponencial do uso da internet e das redes sociais, se identificou um novo rumo: aliar o marketing tradicional com o uso das novas tecnologias, apostando seriamente no marketing digital. A distribuição passou de multicanal a omnicanal e a comunicação passou a ser feita grandemente através das redes sociais, que passaram até a incorporar a possibilidade de compra de artigos.
Em meados de 2021, claramente impactados com uma situação pandémica que despoletou em finais de 2019 e ainda se mantém activa (covid-19), foi notória a necessidade de incrementar tecnologias, quer ao nível da produção de bens (as vacinas são disso um claro exemplo) e serviços (note-se a necessária reestrutura ao nível dos serviços de saúde… e do próprio ministério da saúde).
Na realidade, hoje em dia as marcas deparam-se com clientes muito informados, constantemente ligados na internet, sendo por isso considerados como Blended Consumers, praticantes de R.O.P.O. (research online, purchase offline e vice-versa) e pouco propensos a serem fiéis a uma marca. Há a necessidade de constantemente os surpreender com produtos e serviços verdadeiramente inovadores (out of the box)… e isto maioritariamente consegue-se através do recurso à tecnologia.
O Marketing 5.0 defende uma abordagem humanizada das tecnologias, por imitação do ser humano, como o caminho para criar, cumprir e aumentar valor em todo o percurso do cliente. É a era da experiência do consumidor (CX – customer experience) por excelência. Baseia-se na premissa de que a tecnologia deve acompanhar a filosofia de negócio, sendo que as empresas necessitam ter profissionais de marketing que saibam delinear uma estratégia que use a tecnologia adequada aos diferentes elementos do seu composto de marketing, ao seu core-business e ao seu Segmento de mercado e Público-alvo. Isto, sem perder o foco na humanidade (porque só os humanos conseguem compreender os humanos… e porque ainda não se conseguiu construir uma máquina capaz de estabelecer uma ligação com os clientes similar à que o ser humano estabelece).
A expressão Next Tech (NT) passa a fazer parte do vocabulário dos gestores: conjunto de tecnologias que, quando devidamente utilizadas, aportam maior satisfação do cliente e alavancam a imagem das marcas e a sua performance económica. IA (Inteligência Artificial), Sensores, Robótica, RA (Realidade Aumentada), RI (Realidade Virtual) e IOT; Blockchain (transacções com impressão digital e chave de segurança), conjuntamente com Big Data (bases de dados de clientes) estão a ser implementadas por várias marcas e empresas a nível nacional e internacional. Acredita-se que o uso de tecnologias pode impulsionar as práticas de marketing,
(1) ao permitir a tomada de decisões mais informadas e sustentadas (Big Data);
(2) ao prever resultados de estratégias e tácticas de marketing (ex.: antes do lançamento de novos produtos ou de uma nova campanha);
(3) ao estabelecer uma ponte entre a experiência no contexto digital com a do mundo físico (experiência omnicanal única);
(4) ao libertar os marketers de primeira linha permitindo-lhes focar-se no planeamento estratégico (ex.: Chatbots, que assumem uma variedade de conversas simples, através de respostas rápidas);
(5) ao estimular a execução de marketing, através do envolvimento dos clientes na fase de DNP (desenvolvimento de novos produtos) em plataformas de código aberto e alavancando situações de co-criação (envolvimento de outros parceiros).
Assim, entende-se que o marketing 5.0 direcciona as empresas para um marketing orientado por dados (criação e manutenção de bases de dados sobre os clientes), predictivo (sustentado por toda a informação recolhida), contextual (identificação e criação de perfis de clientes), aumentado (uso de tecnologia digital para melhorar a produtividade dos profissionais de marketing) e ágil (equipas descentralizadas e multifuncionais conseguem maior agilidade de resposta a mercados em constante mudança).
De forma resumida, as empresas actuais devem manter o foco nos seus produtos ou serviços, nos clientes e suas necessidades e desejos, nos valores essenciais à sociedade actual (responsabilidade social e ambiental), na combinação do marketing tradicional com o marketing digital e no uso de novas tecnologias, colocando as mesmas ao serviço do ser humano. Afinal, são Humanos os clientes das empresas.
Artigo de opinião de Sílvia Faria, professora auxiliar do Departamento de Economia e Gestão da Universidade Portucalense