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Opinião

A igualdade começa em casa (ainda não, mas devia)

Não é ao acaso que, a par destas imagens, desenvolvidas pela UZINA, a IKEA ativou também uma parceria duradoura com a Comissão para Igualdade de Género

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A igualdade começa em casa (ainda não, mas devia)

Não é ao acaso que, a par destas imagens, desenvolvidas pela UZINA, a IKEA ativou também uma parceria duradoura com a Comissão para Igualdade de Género

Sobre o autor
Paula Cosme Pinto

“O jantar é para partilhar. Lavar a loiça também”. “A cama é para os dois. Trocar os lençóis também”. Estas frases não são minhas, mas aplaudo-as. Pertencem a uma das mais recentes campanhas da IKEA, que traz às ruas portuguesas mensagens de consciencialização para a importância da partilha de tarefas domésticas.

Numa altura em que grupos bafientos apelam à criação do estatuto da ‘mulher dona de casa’, conteúdos como estes são essenciais para a construção de uma sociedade onde não sobrem dúvidas: a manutenção da esfera doméstica é da responsabilidade de todos os que nela habitam, independentemente do sexo ou género.

Longe vão os tempos em que o dito modelo tradicional servia de organização social única: os homens eram os provedores económicos da família, já às mulheres cabia-lhes exclusivamente a manutenção doméstica e a prestação de cuidados familiares. Hoje, as mulheres são metade da força laboral do nosso país, além de presença cada vez mais ativa e essencial em todas as dimensões. Mas dentro de casa, a evolução não segue à mesma velocidade.

Segundo o estudo “O trabalho não pago”, da Fundação Francisco Manuel dos Santos, em casais heterossexuais, a mulher efetua, em média, 74% das tarefas domésticas, enquanto o homem com quem vive efetua, em média, 23%. Os 3% restantes são feitos pela ajuda externa remunerada. Já a CITE, revela que, em Portugal, as mulheres gastam, em média, quase mais duas horas por dias na realização de tarefas domésticas e de cuidado. É a chamada dupla jornada de trabalho, que se traduz numa enorme e injusta sobrecarga feminina.

A isto soma-se o seguinte cenário laboral: com base em estereótipos de género, as mulheres continuam a ter menos hipóteses logo na fase da contratação. Seguem-se remunerações desiguais, menores oportunidades de progressão de carreira e de acesso a cargos de poder. Uma bola de neve que resulta em menos poder económico ao longo de toda a vida, incluindo na idade da reforma.

Uma equação que continua a empurrar as mulheres para ciclos de menor autonomia e poder de escolha, assim como inferior qualidade de vida a curto, médio e longo prazo. Culminando na problemática dependência financeira, que anda de mãos dadas com a violência doméstica.

Não é ao acaso que, a par destas imagens, desenvolvidas pela UZINA, a IKEA ativou também uma parceria duradoura com a Comissão para Igualdade de Género, que se efetiva na transformação da Linha de Apoio ao Cliente da IKEA numa linha de informação e apoio a estas vítimas. Ou seja, ao ligarem para esta linha, as vítimas podem selecionar o reencaminhamento para o Serviço de Informação a Vítimas de Violência Doméstica, que garante o atendimento por uma equipa técnica especializada, de forma anónima e confidencial.

A IKEA tem esta obrigação? Não. Mas sabe que ao fazê-lo está a usar a sua dimensão e poder de alcance para contribuir para a resolução de um problema estrutural da sociedade. Uma questão de responsabilidade social. Mais ou menos como têm feito grandes hipermercados como o Lidl, por exemplo, com os seus catálogos de Natal com imagens de meninos a brincarem com bonecas e meninas com ferramentas de construção, ou o Aldi, que recentemente anunciava um aspirador com a fotografia de um homem a aspirar a casa com um bebé ao colo.

É um catálogo de supermercado que vai mudar o mundo? Não. Mas pode um catálogo ajudar a esbater estereótipos, optando pela pluralidade na forma como representa os seus e as suas potenciais clientes? Sim. Não menosprezemos o poder de tais imagens, que entram sem agenda política pela casa das pessoas, de todas as pessoas.

Pessoas essas que, se calhar, nem estão de todo viradas para reflexões deste teor, mas que acabam por levar consigo estas imagens e a mensagem que elas comportam: a normalização dos homens enquanto cuidadores e corresponsáveis pela esfera doméstica. Papéis esses que também lhes pertencem, sem desprimor ou desapego – ou, pelo menos, assim deveria ser quando falamos de adultos funcionais.

Assim como o machismo vive, sobrevive e se instala através de uma soma infindável de múltiplos estímulos (que nos chegam das mais variadas maneiras, mais ou menos subtis), também isso pode acontecer com o caminho de desconstrução do que é suposto homens e mulheres serem. Cada vez mais, as marcas, as empresas, o mundo comercial e do negócio, podem ser agentes saudáveis de mudança.

Sobre o autorPaula Cosme Pinto

Paula Cosme Pinto

Comunicadora pela igualdade de género
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