Jornalismo é hoje feito por mais profissionais, mais mulheres e com mais qualificações académicas
Estudo indica, contudo, que a feminização da actividade ainda não tem reflexos ao nível dos cargos de chefia.
Meios & Publicidade
Gliff conquista estratégia de performance digital da Simplefy
HBO Max muda para Max a 21 de maio e passa a transmitir desporto em direto
Pantene não renova contrato com Chiara Ferragni após caso ‘pandoro-gate’
Ana Rita Gomes assume direção de marketing da PHC Software
Wes Anderson realiza filme dos 100 anos da Meisterstück da Montblanc (com vídeo)
Audiências: RTP1 e SIC reforçam quota de audiência semanal
Ligados à Corrente é a nova série digital da Prio (com vídeo)
Sábado comemora 20º aniversário com edição de 154 páginas em formato XL
O que pode ler na edição 956 do M&P
O que pode ler na edição 956 do M&P
O jornalismo é hoje feito por um maior número de profissionais com carteira, por cada vez mais mulheres, sobretudo nas camadas mais jovens, e por pessoas com mais qualificações académicas, indica o estudo Ser jornalista em Portugal – perfis sociológicos. A longa investigação realizada por uma equipa do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES) do Instituto Universitário de Lisboa, que será lançada em livro na quinta-feira, traçou “diversos perfis” do jornalista português, tendo por base 47 entrevistas realizadas em 2006, 2007 e 2008.
Em entrevista à agência Lusa, José Rebelo, professor universitário que coordenou a investigação, realçou que “não é pretensão [do estudo] cobrir todos os perfis possíveis”, mas estão lá “os que mais frequentemente se encontram na profissão”, desde “o estagiário que vai repetindo estágios e que nunca consegue integrar a profissão”, até ao “jovem jornalista que não encontra o que procura e então desiste e vai para profissões conexas, como assessorias ou empresas de comunicação”, passando pelo jornalista desempregado e pelo “jornalista que rapidamente atinge lugares de topo no órgão de comunicação social em que trabalha”. Ser jornalista em Portugal – perfis sociológicos resulta de um trabalho de investigação de cerca de cinco anos, realizada sob a égide da Fundação para a Ciência e a Tecnologia e de um protocolo com o Sindicato de Jornalistas. Para além das entrevistas, “autênticas histórias de vida”, o estudo compara dados dos últimos 20 anos sobre a profissão. E podem tirar-se três “conclusões imediatas”, considera o também ex-jornalista. Em primeiro lugar, destaca José Rebelo, “um aumento extraordinário do número de jornalistas portadores de carteira profissional”, sobretudo na década de 1980 (número que, porém, está a diminuir desde 2000). O aumento deu-se com a adesão de Portugal à CEE e consequentes “alterações económicas e financeiras profundas” – privatizações, aparecimento de “numerosas publicações temáticas”, legalização de “centenas de rádios locais”, aparecimento de dois operadores privados de televisão, enumera.
A segunda alteração é a “subida muito acentuada das qualificações académicas da profissão, que também se começou a manifestar na década de 80” e que “corresponde à multiplicação de cursos em ciências da comunicação, jornalismo, comunicação social”. Estes cursos proliferam com as universidades privadas, que “tendem, o que é natural, a abrir cursos com clientela assegurada e baixos custos, que não impliquem grandes investimentos”, justifica. Isso associado ao lado de “grande visibilidade social” do jornalismo leva a que os cursos de comunicação social continuem “a ter muita procura, apesar da crise que existe neste mercado”. A terceira característica é a “clara feminização da profissão”. Se, “em termos globais, ainda há mais homens do que mulheres”, nas faixas etárias dos 20 aos 25 e dos 25 aos 30 anos “o número de mulheres já é muito superior”, realça o professor. “O que faz supor, sem grande risco, que daqui a curto/médio prazo a percentagem de mulheres na profissão será claramente superior à percentagem de homens”, estima. Isso não quer dizer que não haja “segregação de género” no jornalismo, alerta. “A feminização ainda não tem reflexos ao nível dos cargos de chefia”, quer porque o jornalismo tem um DNA “claramente machista”, quer porque os cargos de chefia “com muita frequência são ocupados por pessoas mais velhas” e nessa faixa etária “a percentagem de homens é ainda muito superior à de mulheres”, explica.
Estagiários exercem funções de jornalistas profissionais
Outra das conclusões do estudo indica que o número de jornalistas com carteira profissional está a diminuir desde 2000, enquanto o de estagiários aumenta. “O estagiário está a exercer as funções que são próprias a um jornalista profissional”, alerta o coordenador de um estudo. José Rebelo realça que “o número de estagiários [no jornalismo] tem vindo a aumentar significativamente”. No exercício de funções “próprias a um jornalista profissional”, o estagiário “exerce-as, por um lado, ganhando menos ou não ganhando, e por outro lado, sem qualquer, ou com uma reduzidíssima, capacidade reivindicativa”, sublinha o docente e também ex-jornalista. Os estagiários “receiam, estão numa situação precária e procuram sobretudo criar um posto de trabalho que não têm”, destaca, considerando que as entidades patronais “beneficiam desta passividade, destes baixos custos, para fazer sobreviver as redacções, sem contestação e a preços inferiores”.
Por outro lado, a diminuição do número de jornalistas profissionais justifica-se com “a crise” – que levou ao encerramento e fusão de órgãos de comunicação –, mas também com o “desenvolvimento dos grupos multimédia”. Estes contribuem “para reduzir os postos de trabalho, na medida em que o mesmo jornalista escreve um artigo para o jornal, um texto para a televisão e é capaz mesmo de escrever uma peça para a rádio”, assinala. Todas estas alterações resultaram em “relações de tensão” nas redacções, que hoje dispõem de gente “mais qualificada, sem dúvida”, mas sujeita também a “um aumento claro dos níveis de precariedade”. Essa “tensão” também existe entre as gerações de jornalistas, porque “os mais velhos” vêem no jornalismo “uma missão”, enquanto “os mais novos” o encaram como “uma profissão”. Recordando que alguns dos entrevistados para o estudo “já vão para aí no terceiro estágio”, José Rebelo frisa que “a inovação e a irreverência não vêm dos mais jovens, vêm daqueles já instalados na profissão, o que parece um paradoxo, só que para se ser irreverente é preciso ter condições para isso e a precariedade não encoraja a irreverência”.
Acreditando que “[hoje] haja auto-censura, relativamente ao poder político, ao poder económico”, José Rebelo conta que os jornalistas reconhecem sempre “pressões” sobre os outros, mas nunca sobre si mesmos. “Quando se pergunta a um jornalista ou um estagiário ‘acha que há pressões que se exercem junto dos jornalistas’, respondem todos que sim; quando se pergunta ‘e sobre si foram exercidas pressões’, respondem que não”. A criação de uma Ordem profissional de jornalistas é uma das perguntas-guião das entrevistas: a maioria “muito clara” é contra (opinião partilhada por José Rebelo), mas todos concordam com a “necessidade de reforçar o Código Deontológico”. Há a ideia de que a Ordem implica “uma imposição de regras, que podem ser expressão de uma arbitrariedade, de uma relação de poder que fuja ao controlo dos próprios jornalistas”, reflecte. Editado pela Gradiva, o livro “Ser jornalista em Portugal – perfis sociológicos” é lançado na quinta-feira, no ISCTE (Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa), em Lisboa. (Lusa)